Escrevo com tinta transparente sobre águas.
A vida líquida transita nas esferas do universo, decantada em pequenos átomos de hidrogênio, onde se encontram as palavras. Do menino sonhador e deslumbrado surgiu o adolescente tímido, e deste, o velho, liquefeito em todas as suas histórias, a olhar o mundo, com as pálpebras caídas e os joelhos em falsete.
Escrevo para não deixar marcas.
Este penúltimo parágrafo, bem poderia ser o resumo de uma vida, de qualquer vida, e o que nos salvaria é a ilusão de que nos ouvem e nos leem, aqueles que nada têm a fazer, a não ser se mostrarem solícitos e compreensíveis, com a solidão das cidades, de paredes cinzas e sol escondido entre prédios.
Escrevo, com traços antigos de escrita indecifrável,
garranchos sem significado, lidos pelos elementais, na liquidez dos meios de
cada dia.
Este outro parágrafo, bem poderia não existir, e efetivamente
não tem qualquer significado, a não ser o arremedo de longínquos espasmos e de
uma comunicação sem retorno.
Escrevo com tinta transparente sobre águas.
E quando ouço as notícias do mundo, mas me convenço que não
são escritas nem pensadas, materialmente construídas sob o influxo do
inconsciente coletivo, que põe tijolo sobre tijolo, e divulga o que há de ser
uma parede, um cômodo, um muro, um palacete, um prédio, um tanque, quem o
saberá? Porque a divulgação pelos meios eletrônicos, não forma a imagem
completa do que se está a ouvir e do que se está a ver. Os meios eletrônicos
são imateriais porque se dissolvem na tela e não guardam qualquer sentido da
vida.
Escrevo com tinta transparente sobre águas.
As letras caem, as palavras submergem, e nada restará do pensamento, e nada restará da ação, mas escrevo, imaginando um reino de faz de conta.
2025 é um novo reino. Faz de conta que sabemos ser ele um pós-2024
e um pré-2026, porque tudo é convenção, e todas as convenções, assim como a
natureza, se desfazem no pó das horas.
Bom que assim seja, nada devemos ao passado e nada devemos esperar do futuro. Tudo é, e sempre será, presente.
Escrevo para despertar os mortos, que enterremos a cada minuto.
Feliz 2025!
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