Por Carlos Roberto Husek, professor de Direito Internacional da PUC/SP e um dos coordenadores da ODIP – Oficina de Direito Internacional Público e Privado
Não se trata, este aqui, de um texto técnico, mas de
reflexões de fatores técnicos utilizados nos discursos, aleatoriamente, para
firmar o exercício da liberdade e da defesa democrática.
Na verdade, na vida política, cada um diz o que quer e
justifica como pode, para alcançar seus desideratos.
Uma petição é inepta quando há falta de pedido e ou de causa
de pedir, quando não há narração lógica dos fatos, quando o pedido se mostra
juridicamente impossível, quando existem pedidos incompatíveis, e nesses casos,
e outros, o juiz não a considera apta para o prosseguimento da demanda.
Será esse o caso da denúncia feita pelo Procurador Geral
sobre os fatos de 8 de janeiro, da chamada tentativa de golpe de Estado?
Baseou-se o Procurador em narrações fantasiosas e toda
denúncia firmou-se apenas no depoimento de uma delação premiada?
A tentativa de golpe não é golpe e, portanto, não é crime;
mas se o golpe fosse consumado, não estaríamos diante de uma nova ordem
jurídica estabelecida, por golpe sobre a ordem anteriormente existente? Nesse
caso, a ordem jurídica atual e a democracia estabelecida pelo Estado, deveria
esperar o sucesso do eventual golpe ou deveria estar preparada para a defesa do
Estado e de suas instituições?
Quando as opiniões atingem os próprios princípios
constitucionais e a própria ordem jurídica do Estado, incitando pessoas e grupos
a agirem não há defesa possível? Tratar-se-ia de simples exercício de liberdade
individual e coletiva?
Hitler exerceu com plenitude sua liberdade de agir contra o
Estado e contra os judeus, provocando a 2ª. Guerra Mundial!
A história contada pela denúncia (e qualquer petição ou ato
judicial, aptos, baseiam-se em histórias, com começo, meio e fim), pelo que observei
tem lógica narrativa e tem provas dos atos ocorridos, também foram amplamente
demonstrados pela mídia falada, escrita e televisiva, com depoimento dos
próprios envolvidos.
Diminuir o tempo de inelegibilidade, por uma lei que foi
gerada por reivindicação da sociedade, só para favorecer objetivos políticos,
não pareceria a todos nós, mesmo para aqueles com pouca leitura e
discernimento, algo antidemocrático, ilegítimo e, provavelmente,
inconstitucional?
É possível dar anistia para grupos interessados que depredam
patrimônio público, aliciam vozes de comando, subvertem a ordem posta, buscam
planejar a eliminação do Presidente eleito, do Vice-presidente e de um Ministro
do Supremos Tribunal Federal, para que depois de anistiados voltarem a planejar
outras iguais tentativas?
Ser de direita não é uma pecha, assim como não o é ser de
esquerda, a mácula está na utilização dessas bandeiras para perpetuação no
poder, porque, salvo engano, nenhum desses caminhos fundamenta-se, validamente,
na supressão de direitos e na derrubada das instituições. Em muito países a
direita vence as eleições e busca administrar o Estado e suas instituições com
um olhar diverso da esquerda. Não se busca, em princípio, a quebra da ordem
jurídica, que convive com a diversidade de opiniões e planeja vencer essa
diversidade, com argumentos e não com a força militar; no entanto, se o faz em
algum discurso ou arrazoado escrito ou oral, na verdade, está utilizando de
frases e palavras de ordem para fazer aflorar o inconsciente primitivo do
domínio e da submissão.
Não se desconhece que existem teorias que justificam tudo,
mas quase sempre escondem vetores dissimulados de apreço ao poder e à própria
imagem. Há um narcisista escondido em cada ditador, que só admira o próprio
reflexo e só considera amigos os bajuladores.
Estamos longe da Democracia, porque dos porões do
inconsciente coletivo ainda surgem os espíritos que espalham os seus próprios e
inconfessáveis atavismos e os seus fétidos propósitos.
Precisamos nos proteger dos argumentos falsos e dos objetivos
escusos. Não é sempre fácil identificá-los, mas a vigilância crítica é um
exercício, que deve ser aprimorado, com a desconfiança inicial sobre tudo o que
se diz ou o que se escreve.
A liberdade de agir e de opinar passa pela conscientização da
vida e dos relacionamentos.
Vamos abrir os olhos e os ouvidos!