sexta-feira, fevereiro 07, 2014

A possibilidade de extradição de Pizzolato




(publicado no Estadão Noite de 06.fev.2014)         

         A prisão de Henrique Pizzolato voltou a levantar uma série de questões recorrentes tanto neste quanto em outros casos, como os de Cesare Battisti e Salvatore Cacciola, para citar apenas os que envolvem Brasil e Itália. Algumas noções básicas do direito internacional são relevantes para a análise do caso.
 
A primeira noção é a de que o Estado tem o dever, e o nacional consequentemente o direito, de proteger aqueles a quem concede a nacionalidade. Decorre deste dever o fato de que a maior parte das nações não extradita seus nacionais, tampouco os retira à força de seu território, mesmo se nele ingressarem com documentos falsos. A extradição é o instituto mediante o qual um Estado solicita a outro a entrega de pessoa que esteja no território deste último. Por se tratar de solicitação em âmbito de tratativas entre Estados, as “leis” que se aplicam são as criadas pelos próprios Estados, denominadas tratados internacionais. Adicionalmente, claro, as normas internas de cada país irão determinar se aquele tratado será ou não cumprido (o ideal seria que o Estado apenas assinasse tratados que teria condições de cumprir, mas nem sempre isto ocorre).
Uma outra noção importante é a da territorialidade. Em breves palavras, significa que o Estado em cujo território um crime seja cometido é o competente para julgar e condenar ou não o acusado. O Brasil, local dos crimes no caso do mensalão, julgou o caso. Por outro lado, aparentemente há o crime pelo uso de documentos falsos cometido por Pizzolato, crime este que foi cometido em múltiplos locais, desde o Brasil mas inclusive a Itália, motivo pelo qual as autoridades italianas podem julgá-lo. A não extradição de Pizzolato pela Itália não será surpresa, não em suposta retaliação ao caso Battisti, mas simplesmente em cumprimento a normas italianas e internacionais que o próprio Brasil analogamente cumpre. Nossa Constituição nega a extradição de brasileiros a outros países, por mais grave que seja o crime cometido no estrangeiro, fazendo apenas algumas exceções aos naturalizados. A Itália certamente fará o mesmo.
É interessante notar que o tratado de extradição entre Brasil e Itália, famoso desde a época do caso Battisti, expressamente desobriga o Estado a quem se requer a extradição que o faça em relação aos seus nacionais. A interpretação de que o nacional pode ser extraditado somente seria possível se a análise do tratado ignorasse as demais leis vigentes no Brasil e na Itália.
À parte os aspectos jurídicos, é preciso lembrar que há um componente político nas ações de cada Estado. As democracias são regidas pelas leis mas estas reservam um espaço para a discricionariedade. Talvez por isso a formulação do pedido de extradição à Itália não seja totalmente descabido. O que o ponto de vista jurídico deixa claro nem sempre é aceito do ponto de vista político e, afinal de contas, o direito ao esperneio é garantido a todos.

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