(publicado no Estadão Noite de 06.fev.2014)
A prisão de Henrique Pizzolato voltou a levantar uma série de questões recorrentes tanto neste quanto em outros casos, como os de Cesare Battisti e Salvatore Cacciola, para citar apenas os que envolvem Brasil e Itália. Algumas noções básicas do direito internacional são relevantes para a análise do caso.
A prisão de Henrique Pizzolato voltou a levantar uma série de questões recorrentes tanto neste quanto em outros casos, como os de Cesare Battisti e Salvatore Cacciola, para citar apenas os que envolvem Brasil e Itália. Algumas noções básicas do direito internacional são relevantes para a análise do caso.
A primeira noção é a de que o Estado tem o dever, e o nacional consequentemente o direito,
de proteger aqueles a quem concede a nacionalidade. Decorre deste dever o fato
de que a maior parte das nações não extradita seus nacionais, tampouco os
retira à força de seu território, mesmo se nele ingressarem com documentos
falsos. A extradição é o instituto mediante o qual um Estado solicita a outro a
entrega de pessoa que esteja no território deste último. Por se tratar de
solicitação em âmbito de tratativas entre Estados, as “leis” que se aplicam são
as criadas pelos próprios Estados, denominadas tratados internacionais.
Adicionalmente, claro, as normas internas de cada país irão determinar se
aquele tratado será ou não cumprido (o ideal seria que o Estado apenas
assinasse tratados que teria condições de cumprir, mas nem sempre isto ocorre).
Uma outra
noção importante é a da territorialidade. Em breves palavras, significa que o
Estado em cujo território um crime seja cometido é o competente para julgar e condenar
ou não o acusado. O Brasil, local dos crimes no caso do mensalão, julgou o
caso. Por outro lado, aparentemente há o crime pelo uso de documentos falsos
cometido por Pizzolato, crime este que foi cometido em múltiplos locais, desde
o Brasil mas inclusive a Itália, motivo pelo qual as autoridades italianas podem
julgá-lo. A não extradição de Pizzolato pela Itália não será surpresa, não em
suposta retaliação ao caso Battisti, mas simplesmente em cumprimento a normas
italianas e internacionais que o próprio Brasil analogamente cumpre. Nossa
Constituição nega a extradição de brasileiros a outros países, por mais grave
que seja o crime cometido no estrangeiro, fazendo apenas algumas exceções aos
naturalizados. A Itália certamente fará o mesmo.
É interessante
notar que o tratado de extradição entre Brasil e Itália, famoso desde a época
do caso Battisti, expressamente desobriga o Estado a quem se requer a
extradição que o faça em relação aos seus nacionais. A interpretação de que o
nacional pode ser extraditado somente seria possível se a análise do tratado
ignorasse as demais leis vigentes no Brasil e na Itália.
À parte os
aspectos jurídicos, é preciso lembrar que há um componente político nas ações
de cada Estado. As democracias são regidas pelas leis mas estas reservam um
espaço para a discricionariedade. Talvez por isso a formulação do pedido de extradição
à Itália não seja totalmente descabido. O que o ponto de vista jurídico deixa
claro nem sempre é aceito do ponto de vista político e, afinal de contas, o
direito ao esperneio é garantido a todos.
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