Por Carlos Roberto Husek, professor de Direito internacional
da PUC/SP e um dos coordenadores da ODIP – Oficina de Direito Internacional
Público e Privado
São discursos narrativos o diálogo, a descrição, a narração e
a dissertação.
Nos diálogos, temos as falas de personagens, em diálogos
diretos, por meio de aspas, travessão e outros expedientes e o diálogo
indireto, quando aquele que comunica diz: “ele disse que...” ou expressões
similares, bem como o monólogo interior, uma espécie de fala mental. A
descrição corresponde a enumeração dos componentes e pormenores de objetos,
paisagens, pessoas. A narração implica em acontecimento, ação e movimento e a dissertação
diz respeito à explanação das ideias ou conceitos.
Como ensinam os professores de Português, estes recursos
podem não aparecer estanques, e sim, misturados, e entremeados de gestos,
dificultando aquele que escuta ou vê de entender o seu conteúdo.
Os políticos – sem qualquer ciência, é verdade, mas com muita
perspicácia – utilizam-se muito disso. Misturam tudo a seu bel prazer, embutem
diálogos nas descrições, fazem narrativas nas suas dissertações, e quando se
vai verificar, não sobra nada aproveitável. O fato desaparece nas expressões,
significados e significantes, falas discursivas e falas que se dizem técnicas,
a ponto de nós – pobres mortais – ficarmos perdidos nessa floresta de
amarrações comunicativas.
Fatos não são fatos, tortura não é tortura, repressão não é
repressão, corrupção não é corrupção, abuso do poder não é abuso do poder. São
somente narrativas.
A Rússia é o país vítima da guerra impetrada, indiretamente
pela Ucrânia?
O Lava Jato e os petrodólares, todos envolvidos, uns e
outros, são vítimas?
Maduro é, na verdade, um democrata, que luta contra as forças
da economia mundial, e contra o gigante do Norte, defendendo o seu povo e o seu
“Estado de Direito”, ainda que, para tanto, mande prender os considerados inimigos
do povo, perpetua-se no poder, para que não haja involução dos objetivos da
república, desfaz o Congresso, que lhe é contrário e os juízes independentes,
tudo em nome da Venezuela. Um herói que prossegue na saga grandiosa e generosa
de Hugo Chaves, o seu mentor espiritual? Ele recebeu comunicação espiritual de
Hugo Chaves, assim que tomou conta do poder!
Narra-se de um e de outro lado, todos convictos de que podem
convencer e de serem favoráveis à Democracia e à República.
Para vencer uma batalha, tudo é possível, desde exércitos bem
armados e “fake news” nas redes de comunicação até discursos inflamados.
Não querer a volta de um desenho de ditador, não pode
significar que se deva assinar, em baixo, de todas as narrativas oficiais e
oficiosas.
Pobre leitor e cidadão que se farta de ouvir narrativas
dissertativas, com diálogos embutidos e descrições imaginosas, e acaba por crer
que um ex-presidente é defensor da família e dos princípios religiosos e da
bandeira nacional e que os que estão no poder são contundentes contra os
despóticos ditadores, do presente e do passado.
O Brasil melhorou – não há dúvida – em termos de suas
relações internacionais; reconstruiu pontes desfeitas, buscou o diálogo,
mostrou-se disposto a ouvir narrativas, sem tomar uma posição que fuja da postura
de interlocutor confiável e mediador possível, pelo menos, até agora.
Ouvir é sábio, para agir e falar, necessário cautela, e
principalmente confiar em assessores acostumados aos diálogos internacionais:
os membros da Diplomacia
As eventuais narrativas – narrativas de narrativas - podem
vir a desfazer o caminho ora percorrido, ou isso também é uma narrativa?
Somos um país de extensas e infindáveis narrativas, internas
e externas.
Vamos descansar em uma clareira – deve haver alguma – nesta floresta comunicativa de desejos, e olhar para ver se através das copas das árvores aparece a luz.
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