terça-feira, dezembro 26, 2023

Navegar é preciso, (sonhar é essencial), viver não é preciso

 


Por Carlos Roberto Husek, professor de Direito Internacional da PUC/SP e um dos coordenadores da ODIP – Oficina de Direito Internacional Público e Privado

 

 

Vamos a uma pequena história de coragem, aceitação, raça, persistência, de superação das agruras do tempo e do espaço, de amor, entrelaçada com os poemas que contabilizam a alma, individual e coletiva:

Dom Henrique cismou, queria porque queria, conquistar o Cabo Bojador, lugar inóspito, perigoso, por causa de uma grande restinga de pedra que dele sai ao mar mais de 4 ou cinco léguas, onde se perderam navios e vidas. Era inabitável, lá para os idos de 1400. Dom Henrique enviou 15 expedições e todas fracassaram; por último confiou a um dos seus mais fiéis escudeiros, em 1434, Gil Eanes, a missão de vencer o Bojador, e este retornou derrotado, mas Dom Henrique não desistiu e exigiu que Gil tentasse novamente – com perdas de vidas, de dinheiro, de equipamentos – e, depois de muita luta e de rotas diversificadas, foi conquistado. Daí nasceu o lema “navegar é preciso, viver não é preciso”[1]

Pergunto-me: Por que se luta tanto, às vezes por nada? Acho que não importa a causa, luta-se e pronto!

No poema Mensagem de Fernando Pessoa, há referência ao Bojador e à vida:

 

X – Mar português

Ó mar salgado, quanto do teu sal

São lágrimas de Portugal!

...................................................

Valeu a pena? Tudo vale a pena

Se a alma não é pequena.

Quem quer passar além do Bojador

Tem que passar além da dor (grifos nossos)

Deus do mar, o perigo, e o abismo deu,

Mas nele é que estabeleceu o céu.

 

E na composição de Caetano Veloso:

 

“O barco!

Meu coração não aguenta

Tanta tormenta, alegria

Meu coração não contenta

O dia, o marco, meu coração

O porto, não!...

 

Navegar é preciso

Viver não é preciso (2x) (grifos nossos)

 

O barco!

Noite no teu, tão bonito

Sorriso solto perdido

Horizonte, madrugada

O riso, o arco da madrugada

O porto, nada!...

 

Navegar é preciso

Viver não é preciso (2x) (grifos nossos)

 

O barco!

O automóvel brilhante

O trilho solto, o barulho

Do meu dente em tua veia

O sangue, o charco, barulho lento

O porto, silêncio!...

 

Navegar é preciso

Viver não é preciso (6x) (grifos nossos)

 

Mais uma vez Pessoa em Tabacaria:

 

Não sou nada.

Nunca serei nada.

Não posso querer ser nada.

À parte disso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.” (grifos nossos)



[1] Bueno, Eduardo. A viagem do descobrimento. L&PM POCKET Editores, 2023, p. 87/88.

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