terça-feira, abril 29, 2014

Ainda sobre a extradição de Pizzolato.


crédito da imagem: Estadão



Publicado originalmente no Estadão Noite - 25/04/2014



A possibilidade ou não da Itália anuir com o governo brasileiro e determinar a extradição de Henrique Pizzolato ao Brasil é daqueles assuntos que não têm resposta direta, já que depende, além de fatores jurídicos (o que por si só garante alguma imprecisão na resposta, dada a possibilidade de interpretações distintas), do fator político que os países em geral utilizam na decisão da generalidade dos casos quem envolvam relações com outros Estados, como é o caso do tema extradição.


Cada Estado tem o dever de proteger seu nacional e, do ponto de vista jurídico, em geral o faz a partir do disposto em sua constituição, em sua legislação infraconstitucional e nas normas internacionais. Os italianos têm ainda, na condição de europeus, a proteção das normas comunitárias da União Europeia. Henrique Pizzolato, brasileiro mas também nacional italiano, goza dessa proteção jurídica. Portanto, falar da possibilidade de sua extradição ao Brasil significa analisar o que todas essas normas determinam.


A constituição italiana não proíbe expressamente a extradição de seus nacionais, impedindo apenas a extradição motivada por crimes políticos, neste caso frisando que a exceção é válida tanto para estrangeiros quanto para nacionais. Aos nacionais, determina ainda que a extradição somente é possível quando houver expressa previsão em convenção internacional. Como se sabe, há tratado entre Brasil e Itália sobre extradição e este prevê a faculdade de recusa da extradição do nacional de um Estado ao outro. Por este ângulo, portanto, a extradição de Pizzolato pela Itália ao Brasil não é uma impossibilidade jurídica, mas dependeria da boa vontade do governo italiano.


Do ponto de vista da proteção das normas da União Europeia, igualmente há a possibilidade jurídica da extradição de Pizzolato. Em primeiro lugar, a Convenção Europeia dos Direitos do Homem não impede aos países que extraditem seus nacionais. Por outro lado, um dos principais argumentos dos condenados no caso do mensalão, a inexistência do segundo grau de jurisdição (o direito de submeter o resultado final do julgamento a um recurso de instância superior), argumento que está sendo utilizado inclusive na Comissão Interamericana de Direitos Humanos por alguns outros dos réus condenados, também não impede a extradição no caso de Pizzolato. É que a Convenção Europeia expressamente admite que não há necessidade do segundo grau na hipótese de julgamento direto pela mais alta corte do país – o que, diga-se, faz todo o sentido.


Sendo assim, do ponto de vista jurídico é sim possível, embora duvidosa e definitivamente não obrigatória, a extradição de Pizzolato ao Brasil. Resta ao caso o fator político, numa receita temperada ainda pelo princípio da reciprocidade que via de regra é aplicado nas relações entre os países. A decisão final da extradição, na Itália como no Brasil, compete não ao Poder Judiciário mas ao Executivo – cujas decisões são eminentemente políticas. Há o precedente italiano da não extradição do nacional italiano (e brasileiro) Salvatore Cacciola ao Brasil. E há, agravando, o precedente da não extradição pelo Brasil do nacional italiano (e não brasileiro) Cesare Battisti à Itália. A resposta, portanto, não é óbvia e dependerá do humor do governo italiano. Cartas ao senhor embaixador italiano em Brasília.