terça-feira, junho 14, 2022

OS PILARES DA REPÚBLICA

 


Por Carlos Roberto Husek – professor de Direito Internacional da PUC/SP e um dos coordenadores da ODIP – Oficina de Direito Internacional Público e Privado


 

De tanto ver triunfar as nulidades,

de tanto ver prosperar a desonra,

de tanto ver crescer a injustiça,

de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus,

o homem chega a desanimar da virtude,

a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto.” Rui Barbosa.

 

Será que não há saída?

PEC do Congresso para anular decisões não-unânimes do STF e para anular decisões inconstitucionais do STF!! Mas quem vai dizer que a decisão é inconstitucional... os próprios parlamentares interessados? Mas se Ministros do STF – seres humanos – não votarem do mesmo jeito e a favor de interesses do poder estabelecido, anula-se a decisão pela lei? E se votarem da mesma forma, contrária a tais interesses, anula-se a decisão por inconstitucional?

Pode com consciência da causa pública (res publica), com espírito democrático e de forma republicana, alguém propor isso?

Desmatamento, desmonte das instituições, falta de fiscalização sobre os que tentam quebrar as regras estabelecidas, descrédito geral sobre as normas de funcionamento do Estado Democrático de Direito. E a constante promoção de conflito entre poderes e dentro dos próprios poderes!!

E continua Rui:

Essa foi a obra da República nos últimos anos. No outro regime o homem que tinha certa nódoa em sua vida era um homem perdido para todo o sempre – as carreiras políticas lhe estavam fechadas. Havia uma sentinela vigilante, de cuja severidade todos se temiam a que, acesa no alto, guardava a redondeza, como um farol que não se apaga, em proveito da honra, da justiça e da moralidade gerais. Na República os tarados são os taludos. Na República todos os grupos se alhearam do movimento dos partidos, da ação dos Governos, da prática das instituições. Contentamo-nos, hoje, com as fórmulas e aparências, porque estas mesmo vão se dissipando pouco a pouco, delas quase nada restando. Apenas temos os nomes, apenas temos a reminiscência, apenas temos a fantasmagoria de uma coisa que existiu, de uma coisa que se deseja ver reerguida, mas que na realidade, se foi inteiramente. E nessa destruição geral de nossas instituições, a maior de todas as ruínas. Senhores, é a ruína da justiça, colaborada pela ação dos homens públicos, pelo interesse dos nossos partidos, pela influência constante dos nossos Governos. E nesse esboroamento da justiça, a mais grave de todas as ruínas é a falta de penalidade aos criminosos confessos, é a falta de punição quando se aponta um crime que envolve um nome poderoso, apontado, indicado, que todos conhecem...

Era pelos idos de 1914. Rui repetiria com os mesmos fundamentos tal discurso?

Apesar de tudo, acreditamos na força intrínseca da República; aquela força que está na construção moral de cada um, nas dúvidas que todos temos sobre o futuro e sobre as nossas próprias razões, no direito individual dentro do direito coletivo, na liberdade de sermos muitos e não únicos, no amparo dos livros e não das armas.

Há uma base, uma argamassa, uma fundação na construção do edifício social, solidificada na consciência dos que atapetaram a nação com as regras constitucionais e aos poucos foram criando e desenvolvendo o corpo de leis que desenha o sistema jurídico, de acordo com as premissas maiores e os princípios da Democracia.

Ainda acredito!

 

 


quinta-feira, junho 09, 2022

Migalhas odipinianas

 


Por Carlos Roberto Husek – professor de Direito Internacional da PUC/SP e um dos coordenadores da ODIP – Oficina de Direito Internacional Público e Privado



05 de junho – Dia Mundial do Meio Ambiente, consagrado na Rio-92, na qual foram elaborados alguns documentos que não pareceram sensibilizar os governantes, principalmente brasileiros, tais como a Carta da Terra, com três convenções: Biodiversidade, Desertificação e Mudanças Climáticas. Além disso uma Declaração de princípios sobre florestas, Declaração do Rio sobre Ambiente e Desenvolvimento e Agenda21.

A Convenção da Biodiversidade foi aprovada por 156 países, ratificada pelo Brasil, entrou em vigor em nossa terra em 1993. Seus objetivos são: conservação da biodiversidade, uso sustentável de seus componentes, utilização de recursos genéticos, destacando-se o Protocolo de Biossegurança, que permite que países deixem de importar produtos que contenham organismos geneticamente modificados.

Importante em tais documentos a preocupação com a desertificação, observando o estudo que o risco de desertificação no mundo atinge 40% da superfície terrestre, considerando regiões urbanas e rurais.
O Brasil teve e tem fotografia clara e certa nesta desertificação, em terras da Bahia, Pernambuco, Sergipe, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Amazônia, Rondônia, Paraná, Mato Grosso do Sul. São Paulo, Rio Grande do Sul e Minas Gerais.

Um dos últimos recortes nessa caminhada ao descumprimento, da ECO-92 parece estar diariamente nos noticiários sobre a devastação da Amazônia, derrubada de árvores, queimadas, morte dos riachos, desaparecimento da flora e da fauna; o deserto substituindo o verde, o sol não mais atravessando com brilho a copa das árvores, mais arrasando com seus raios o solo, que passa a se mostrar como uma pele envelhecida de terra quebradiça e seca.

Ano de 2022 e o Brasil respira com dificuldade, quando, por natureza, tem os melhores pulmões da face da Terra.

Não aprendemos nada com a ECO-92.

Poderíamos alimentar o mundo - não é somente uma frase de efeito e sim uma realidade, medida e apreciável, por todos que querem a verdade, olhando-a de frente, sem medo de cara feia, armas carregadas dos que se sentem donos do poder.

É fato que tudo é motivo de terror se não houver cooperação, sensibilidade, consciência coletiva, educação e respeito ao sistema jurídico e à Constituição Federal. É preciso dar as mãos e pensar ouvindo e ouvir pensando, sabendo que o exercício da escuta e da resistência é o único instrumento para consagrar o mínimo da vontade humana ao objetivo comum da sobrevivência.

“Pátria amada, Brasil”

quarta-feira, junho 01, 2022

A catarata psicótica

 


 

Por Carlos Roberto Husek – professor de Direito internacional da PUC/SP e um dos coordenadores da ODIP – Oficina de Direito Internacional Público e Privado


A psicose branca é aquela que não tem manifestação clínica de fácil identificação, por vezes passa por um estado depressivo, ou uma evolução psicótica limite, um funcionamento mental vazio, com ataque de pulsões destrutivas, embotando a consciência, não a despertando para a realidade. Às vezes me pergunto, se alguns dirigentes do mundo atual, aqui no Brasil e no mundo, não sofrem disso? Aquilo que qualquer pessoa do povo, normalmente consideraria absurdo, contrário à realidade, desequilibrado, sem amparo na regularidade e percepção da vida cotidiana, parece não configurar as ações e atitudes dos que foram eleitos pelo povo para exercer um cargo na administração pública. Qual será o segredo desse mistério psicológico? Será que a política atrairia pessoas limítrofes, que não conseguem viver o dia a dia das relações privadas, e seria um meio propício para desenvolvimento de síndromes, bichos psicológicos, despertando monstros internos de afirmação do poder?

A política não deveria ser a “nobre arte” dos melhores da sociedade que se dispunham a desenvolver, por uma tendência natural de pensar no outro, a pensar na comunidade? Teríamos nós, pobres eleitores, que escolher para votar aqueles que não vão incendiar a administração entre o bando de psicóticos que buscam ocupar cargos públicos?

Por que é impossível seguir o curso normal do rio; deixar as águas correrem, apenas tirando as eventuais sujeiras, obstáculos, pedras, folhas e apenas acompanhando o desenvolver do caminho? Por que é tão difícil esperar, ouvir, dialogar, planejar, contar com experiências do passado, construir, acrescentar? Por que há necessidade de destruir o que foi feito, refazer muros, impor as próprias ideias, cercar-se de fanáticos e não de pensadores? Tudo isso é psicose política ou é minha psicose particular?

Fiz, há poucas semanas uma operação de catarata – desculpem, nunca falo de mim, porque entendo não ser interessante a ninguém – mas, a catarata limpa os olhos de uma nuvenzinha, que vai com o tempo tomando conta do globo ocular e, em tese, a pessoa passa a enxergar melhor. Será? Antes via o mundo um pouco embaçado, e agora, vejo uma catarata no mundo, que se embaça por si só. Não há clareza nas atitudes, não há clareza nas falas, não há clareza nas possíveis consequências. Quem pode implantar uma lente nova na vida da cidade, uma incisão na córnea das relações sociais, para fazê-la melhor? Estamos vivendo – há tempos que estamos, – escuros, obscuros, plúmbeos, nebulosos, psicóticos, cataráticos -; e não há salvação? 

Tempos difíceis! Tempos de eleição! É como se fossemos todos médicos, prontos para cirurgia social: salvar a sociedade da visão turva, embaçada, repleta de pontinhos negativos, com doenças novas como as “fake News”, com justificativas absurdas arrimadas em maior armamento e menor educação. A sociedade é um paciente muito doente, de uma doença nova chamada de “catarata psicótica”, que tem por agentes, políticos que se servem da democracia para espalhar a inflamação dessa novel cegueira, e que atinge a todos, pouco importando o cargo que ocupam, o estudo que tiveram, os ideais que eventualmente professaram na juventude! 

Todavia, votar é o único caminho de técnica cirúrgica. Vem a calhar um soneto de desespero e conformismo de Camões:
 
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
Muda-se o ser, muda-se a confiança;
Todo mundo é composto de mudanças,
Tomando sempre novas qualidades,
Continuamente vemos novidades,
Diferentes em tudo da esperança;
E do bem (se algum houve...) as saudades.
O tempo cobre o chão de verde manto,
Que já coberto foi de neve fria,
E em mim converte em choro o doce canto,
E, afora este mudar-se cada dia,
Outra mudança faz de mor espanto:
Que não se muda já como soía.”