(O nome é emprestado e tem conotação um pouco diversa a que
lhe deu o antropólogo Cláude Levi-Strauss, apenas para efeito do presente
artigo)
Carlos Roberto Husek
Prof. de Direito Internacional da PUC/SP e um dos coordenadores
da ODIP – Oficina de Direito Internacional Público e Privado.
Analisando o Brasil atual, das “rachadinhas”, da compra de
votos dos parlamentares para benefício da manutenção do poder, o desmonte da
cultura e da escola, o pouco apreço pelo Judiciário e pelas instituições, em
geral, a pouca leitura da Constituição Federal, salvo para interpretação em
benefício próprio, o incentivo na compra de armas, o desprezo pelas diferenças
sexuais e raciais, a busca incessante do poder e do dinheiro para o domínio sem
contestação, com a utilização de notícias falsas por intermédio da comunicação
eletrônica, a distribuição de comendas e medalhas para os apaniguados e membros
da família, desprestigiando, por exemplo, a Ordem do Cruzeiro do Sul e a do
Barão do Rio Branco, enfim, a compra pela vaidade e pela moeda, a exigência de
que se dobre a coluna servilmente perante o “trono” presidencial e a busca de
aparelhar o Legislativo e, se possível, o Judiciário, com pessoas que servem
aos propósitos da ganância dominadora, fazem concretizar estes “tristes
Trópicos”. Emprestando a este título de Claude Levi-Strauss, uma dimensão maior
e atual do que hoje se passa.
“Tristes Trópicos”, que não conseguem plantar, colher e
meditar; que não consegue subjugar a forme, que não consegue fazer valer a
decência e a moral, nunca e em nenhum sentido, que produz homens da cultura
para defender privilégios e abocanhar parte do que se retira da sociedade,
deixando à mingua os desvalidos, favelados, subnutridos de alimento e de informação.
“Tristes Trópicos”,
que vivem em pleno século XXI, como na época dos baronatos e dos escravos.
“Tristes Trópicos” que compram a consciência de cada um, e se
possível do grupo e da coletividade, fazendo com que a ciência seja
desrespeitada até por alguns cientistas, que se vendem pela ideia ou por algum
favor político.
“Tristes Trópicos”, que escondem os pensadores, porque
pensaram em desacordo com a manutenção do poder, como no caso de Gilberto
Freire, posto à marginalidade, como pária social, sem medalhas ou comendas.
“Tristes Trópicos”, onde a Cultura é simples secretaria e é
conduzida por alguém de arma na cintura, como se revivesse o faroeste dos
filmes norte-americanos, e que a pasta da Educação interfere no conteúdo das
provas para fazer prevalecer a política panegírica de centralização do mando, e
que busca separar as crianças por seus eventuais defeitos, como a animar a
criação de uma “raça pura”.
“Tristes Trópicos”, tão tristes que parecem sucumbir aos
desmandos, à corrupção, aos interesses mesquinhos, ao apadrinhamento e não têm
força para que as flores do raciocínio, da intelectualidade, do equilíbrio, não
vicejem em meio à floresta de espinhos e que não permitem quaisquer raios de
sol. Estamos no escuro, dominados pelos fantasmas da ignorância. Triste América
Latina.
Triste Brasil, que nasceu em “berço esplêndido” e agora
dormita à beira do Atlântico. Não temos, afinal, homens capazes de
sensibilidade e de pensar no todo, no próximo, na sociedade? Não temos
estadistas, mas só extrativistas gananciosos, prontos para extrair e chupar
cada centímetro do homem e da terra.
Fernando Calderón e Manuel Catells retrataram os tempos
modernos: “Nas duas primeiras décadas do século XXI quase todos os países da
América Latina viveram uma sucessão de graves crises sociopolíticas que
abalaram a estabilidade do Estado, afetando o processo de desenvolvimento em
seu conjunto. Na raiz de praticamente todas as crises havia um fator desencadeante:
a corrupção. O que os golpes militares foram no século XX como fator
perturbador do Estado e da sociedade é no século XXI a corrupção sistêmica, que
caracteriza todos os regimes políticos e destrói o vínculo de confiança entre
cidadãos e Estado, fundamento psicológico e cultural que embasa a legitimidade
da democracia. Por isso a corrupção é grave – porque, quando a América Latina
parecia enfim ter alcançado o ideal de democracia liberal pelo qual tanto
sangue, suor e lágrimas haviam sido derramados, um novo espectro começa a
corroer a institucionalidade sobre a qual o cotidiano das pessoas repousa: a
corrupção do Estado.”
Por que a Democracia é tão difícil e inalcançável?
“Tristes Trópicos”.