Por Henrique A. Torreira de
Mattos
A Teoria da Trasnormatividade parte da premissa de que no mundo em que
vivemos, onde existe uma interação sobremaneira do ponto de vista das relações
econômicas, sociais e culturais, proporciona uma discussão entre governos, seja
no âmbito local, nacional, regional ou global, de modo que as normas
internacionais deixam de ser discutidas internacionalmente pura e simplesmente,
sendo discutidas em diversos foros independentemente de fronteiras.
Na década
de 1950, Philip Jessup
abordava o tema com muita propriedade. Para ele as relações transnacionais
entre os seres humanos produziam consequências transnacionais, não cabendo a
justificativa da aplicação do Direito através das doutrinas monista e dualista.
No seu entender, em situações como esta a transnormatividade ocorre entre a
relação existente dos dois Direitos Internos, direcionados pelo Direito
Internacional.
Neste
âmbito, o Direito Internacional origina-se da relação entre dois Direitos
Internos e não os cria, definição que na época era contrária ao pensamento
corrente que de certa forma via no Direito Internacional uma via direcionadora
do Direito Interno (escolas monista e dualista).
Neste
ponto, sua teoria era contrária ao monismo e ao dualismo por dois fatores. O
primeiro, se baseava na relação entre seres humanos, que de certa forma
configurava o mesmo princípio formador do Direito Interno. O outro fator, em
função de analisar a questão da perspectiva interna para a internacional.
Para Philippe
Braillard,
em estudo realizado sobre a sociedade transnacional, este a definiu como um sistema de interação, num
domínio particular, entre atores sociais pertencentes a sistemas nacionais
diferentes, visualizando que no interior de cada sistema nacional, as
interações são decididas por elites não-governamentais e continuadas
diretamente pelas forças sociais, econômicas e políticas nas sociedades de que
fazem parte.
Diante
desta explicação pode ser inferido que entre o Direito Internacional e o
Direito Interno existe uma relação baseada em três pilares (internacional,
global e interno) que caracterizam uma relação transnormativa.
O primeiro
pilar acima citado, o internacional, representa uma tendência Estatal normativa
internacional que visa a criação de determinada norma. O segundo, ou seja, o
pilar global, representa o foro de discussão da sociedade civil internacional
com exceção dos Estados, e por fim, o pilar local, representa a sociedade civil
interna que promove a manutenção da conduta discutida nos foros internacionais.
Atualmente,
a Teoria da Transnormatividade vem criando situações onde a transposição de um
direito por outro, proporciona efeitos mais ágeis para amparar a globalização.
Em muitas situações a cópia do direito alienígena, visando uma adequação
interna para se preparar ao mundo global é importante e com certeza fomentou, e
ainda fomenta, uma maior interação entre os Estados.
Um ponto
importante a ser analisado é se, esta rápida adaptação transnormativa, seria
sustentável, tendo em vista a distinção cultural, social e legislativa além
fronteiras. Em outras palavras, antes da aplicação de uma norma transnacional
deve haver um debate interno grande, a ponto de definir se a aplicabilidade
desta norma alienígena é viável ou não, e é compatível ou não aos parâmetros internos.
Para Wagner
Menezes:
“Essa
relação transnormativa se caracteriza por vários fatores de alocação de uma
nova realidade internacional que, através de seus instrumentos normativos
produzidos no plano internacional, dissolvem as fronteiras e possibilitam uma
interpenetração de normas jurídicas entre o local e o global em um mesmo espaço
de soberania e competência normativa. Elementos de fundamentação da construção
normativa, como as fontes do direito, incluindo as soft law; o direito
comunitário e seus mecanismos específicos para regulamentação intra-bloco; as
regras de direitos humanos que passam de uma simples resolução e adotam cada
vez o caráter de um ius cogens, um direito imperativo que deve ser
respeitado e observado por todos os povos; as organizações internacionais, seus
foros e sua atividade pseudo-Iegislativa; a transnacionalização da ordem
econômica que envolve um número maior de temas e opera entre fronteiras, não só
através do seu principal objeto, que é o capital, mas também por sujeitos
operacionais, como as empresas transnacionais.”
Diante das
considerações acima, o que se nota é que a Teoria da Transnormatividade recebe
críticas, pois pode colocar em risco o conceito clássico de soberania, uma vez
que o Estado não possui mais, necessariamente, o poder criador da norma
internacional do ponto de vista analisado pelas doutrinas monista e dualista.
Ao contrário, o Estado passa a ser receptor de normas estrangeiras, que muitas
vezes podem ter sido criadas por um outro Estado, organizações internacionais
ou pela própria sociedade civil internacional.
Outro ponto
a ser considerado, é o fato de que tais normas não necessariamente
subordinam-se a hierarquias internas do Estado para produzirem seus efeitos, ou
seja, não se trata de um ius cogens.
Nota-se,
portanto, que além das barreiras geográficas, as normas ultrapassam também
barreiras jurídicas, filosóficas e sociológicas, sendo criado um espaço global
normativo.
Bibliografia:
HELD, David; MCGREW, Anthony. “Prós e contras da
globalização”. Tradução Vera Ribeiro. Editora Zahar, 2001;
JESSUP, Philip C. “Direito transnacional”. Tradução
Carlos Ramires Pinheiro da Silva. Editora Fundo de Cultura, 1956;
BRAILLARD, Philíppe. “Teoria das relações
intemacionais”. Tradução J. J. Pereira Gomes e A. Silva Dias. Fundação Calouste
Gulbenkian, 1990;
MENEZES, Wagner. “Ordem Global e
Transnormatividade”. Editora Unijui. 2005;
IANNI, Octávio. “A era do globalismo”. Editora
Civilização Brasileira, 1996.
HELD, David;
MCGREW, Anthony. “Prós e contras da globalização”. Tradução
Vera Ribeiro. Editora Zahar, 2001. Pág. 88.
JESSUP, Philip C.
“Direito transnacional”. Tradução
Carlos Ramires Pinheiro da Silva. Editora Fundo de Cultura, 1956. Pág. 124.
BRAILLARD,
Philíppe. “Teoria das relações intemacionais”.
Tradução J. J. Pereira Gomes e A. Silva Dias. Fundação Calouste
Gulbenkian, 1990. p. 275.
IANNI, Octávio. “A
era do globalismo”. Editora
Civilização Brasileira, 1996. Pág.178.