Por Carlos por Carlos Roberto Husek, professor de Direito
Internacional da PUC/SP e um dos coordenadores da ODIP – Oficina de Direito
Internacional Público e Privado
“Não se pode exigir da extrema juventude a exata ponderação
das coisas; não há impor a reflexão ao entusiasmo.”[1]
Com razão Machado de Assis, embora os tempos atuais demandem
um pouco de reflexão e de direcionamento do entusiasmo.
De que juventude falamos? A juventude vem, de ordinário,
considerada em termos de idade, entre 11 e 18 anos –para os mais antigos–
estendendo-se até os 21 ou 22 anos –para os atuais– e, considerando o progresso
da Medicina, até mais, atingindo os 30 ou trinta e poucos, já que se prolonga
cada vez mais a vetusta idade, que hoje ultrapassa os 70 anos –idade média esta–,
com a tendência de chegar aos limites dos 80 ou 80 e poucos, para só depois
considerar-se a velhice como um marco, a partir daí.
Na verdade, se antes tínhamos a formação escolar como
necessária etapa para a base do entusiasmo que não dispensava a reflexão, nos
tempos de hoje, que voam céleres, do bebê ao velho –as décadas passam acopladas
em anos cada vez mais diminutos– não se pode esperar do “jovem” muita reflexão;
não há tempo, ou ele faz já, ou não faz nunca. E, aí, se perde a possibilidade
da meditação e do aprimoramento.
É necessário alcançar, o mais depressa possível, o estrelato,
a gerência, a diretoria, o aplauso, a riqueza, o espaço. Não se há de admitir o
aprendizado, que demande tempo, nem muito menos o eventual fracasso no caminho:
todos se entendem suficientemente maduros, para saber o que é melhor; e se
assim não ocorrer, a desistência e a partida para outros objetivos, outras
possibilidades é o que se descortina.
Lembro de uns versinhos, cujo autor, salvo engano, é anônimo:
“O tempo Não me dá tempo/ de bem o tempo fruir/ e nesta falta de tempo/ nem
vejo o tempo fugir.”
O que podemos esperar de nosso sistema de ensino, se não
observamos o legítimo entusiasmo e a necessária reflexão, edificados no patamar
da cultura e na transmissão de velhas lições?
Talvez estejamos produzindo folhas soltas, sem parágrafos
coordenados, sem capítulos, sem conexão entre começo, meio e fim. Não depende
das novas gerações, mas da divulgação e coordenação pelo Estado, da cultura
–amplamente considerada–, que hoje, no Brasil, se encontra apartada das reais necessidades
sociais.
Vale a notoriedade, o visual, o dizer sem dizer, o agir sem
agir. Na sociedade da comunicação em rede: milhares de amigos, todos aplaudindo
e batendo palmas, sem a efetiva aproximação e empatia, sem o olhar no olhar,
sem o necessário abraço.
É o mundo do consumo. De um consumo de retalhos, de cores
(caras, bocas), das aparências, da psicologia em algumas linhas, do apelo a veneração
momentânea e, também, ao ódio desenfreado, à inveja, às demonstrações de brilho
(nas roupas, nos lábios, nos olhos, nos carros), de “selfs” e de apelos fáceis.
A profundidade das coisas e dos fatos, perdem-se em um abismo de intenções
superficiais.
Milton Santos, analisa:
“Também o consumo muda de figura ao longo do tempo.
Falava-se, antes, de autonomia da produção, buscava também manipular a opinião
pela via da publicidade. Nesse caso, o fato gerador do consumo seria a produção.
Mas, atualmente, as empresas hegemônicas produzem o consumidor antes mesmo de
produzir os produtos...(...) Tudo isso se deve, em grande parte, ao fato de que
o fim do século XX erigiu como um dado central do seu funcionamento o
despotismo da informação...(...) Como as atividades hegemônicas são, hoje,
todas elas, fundadas nessa técnica, o discurso aparece como algo capital na
produção da existência de todos. Essa imprescindibilidade de um discurso que
antecede tudo – a começar pela própria técnica, a produção, o consumo e o poder
– abre porta à ideologia.”[2]
Educar na sociedade de consumo, pelo consumo e para o consumo,
mal dirigidos pelo entusiasmo sem qualquer reflexão, dessa nossa juventude, dos
11 aos 70 anos, é tarefa para a qual o Estado não está preparado, e talvez, nem
queira fazê-lo, dependendo dos seus objetivos ideológicos. Dividir para
governar.
O engano e a magia das palavras soltas e dos gestos imitativos;
espelhos sem fundo; sombras na caverna.
Todos buscam alcançar a notoriedade, em especial desfilando pelo
Instagram. E o que se vê nas redes sociais? Uma infinidade de gestos e olhares
e de palavras de ordem, sem lastro, e milhares de seguidores. A extensão
comunicativa e a limitação do conteúdo, só expresso no intuito de agradar ou de
contar os próprios momentos de alegria, de enfado, de tristeza. Espelho.
Contentamos em ver, e quem sabe, seguir o mesmo caminho da comunicação plana e
sem maiores comprometimentos. O mundo do faz de conta, com infinidade de
“amigos”.
O Estado mudando a forma de exercer o poder, ou perdendo gradativamente
suas garras sociais. Tem-se que se fragmentou diante dos diversos poderes
privados, e só se mantém como ente de direito público interno, pelas regras
institucionais.
O verdadeiro poder está na comunicação individualizada de
pessoas, organizações, empresas que determinam os rumos a serem seguidos. O
espelho não funciona para o Estado, que não se enxerga e não vê ou não quer ver
os fatos e as possibilidades.
É fato que o mundo de cada um, gira em torno do próprio eu,
pelo eu e para o eu: a um grande “self”, que globaliza o indivíduo, independente
da busca, mais midiatizada do que concreta, de uma globalização efetiva.
Nosso entusiasmo direcionado na busca da realização pessoal,
conflita com as razões do Estado, que deveriam pautar-se pelo comum. É uma luta
surda; um braço de ferro, em que o perdedor –seja ele quem for– faz sucumbir a
própria razão do jogo, ou se quiserem, a razão de viver.
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