Por Fabrício
Felamingo
E lá se foi 2020. Neste nosso blog a agenda política e cotidiana tem
se imposto muitas vezes sobre a análise internacional. O coronavírus tomou
conta do noticiário durante o ano passado e se mostra resistente a ponto de se
manter por ainda muito tempo na mídia (e entre nós). EUA e Brasil, tendo em
vista as atitudes de seus respectivos (des)presidentes, igualmente eclipsam as
atenções e geram mídia (contra e a favor). No geral, tanto a saúde pública quanto
a democracia sofrem em ambos os países por conta dessas similitudes.
Das várias semelhanças, uma em especial podemos destacar aqui: há
uma correlação direta entre a inserção internacional de uma nação e seu grau de
democracia (e, em 2020, aparentemente também seu grau de sucesso em evitar
mortes pelo novo vírus). Ambos os presidentes se isolaram e isolaram seus
países na esfera internacional. O próprio mote de campanha de Trump (fazer a
América “grande” novamente) já embutia uma mensagem claramente xenófoba, na
medida em que se tratava de tornar os EUA “grande” deixando de lado ou
diminuindo o relacionamento comercial com outros países. A deliberada saída dos
EUA de tratados ou acordos internacionais, ou mesmo a simples ameaça de, já são
suficientes para fragilizar o sucesso desses arranjos entre as nações, o mesmo
valendo para organizações internacionais como ONU ou OMS, atacadas
constantemente pela atual Casa Branca.
Por aqui, as tentativas de reproduzir (“i-mitar”?) tais atitudes nos
levaram até mesmo a situações embaraçosas, tais como não obter votação
minimamente aceitável para preenchimento do posto de Juiz do Tribunal Penal
Internacional. Perder a votação seria do jogo, mas obter votação pífia somente
mostra o quão isolado está o Brasil internacionalmente.
O ápice da má governança veio não na forma de clímax, mas de acúmulo
diário: mais de 360 mil mortes lá e quase 200 mil aqui, na data em que
escrevemos estas linhas. Mas ontem, 6 de janeiro de 2021, surgiu um ápice (adicional?)
contra a democracia: o presidente dos EUA ousou convocar e instigar militantes
para se insurgir contra o Congresso norte-americano, que naquele dia iria (como
efetivamente fez, horas mais tarde após a confusão) ratificar a vitória de Joe
Biden para a presidência dos EUA a partir de 20 de janeiro próximo. Além de
todas as cenas lamentáveis, ao menos quatro pessoas perderam a vida nessa
inconsequência fomentada por Trump. O receio é a reprodução (“i-mitação”?) de
tais atos “presidenciais” por aqui, num futuro próximo.
Criar barreiras diplomáticas com outras nações, transformando em
inimigos aqueles que apenas têm interesses antagônicos (sejam comerciais, sejam
quais forem), somente isolam a nação. Não à toa se entende as relações entre
Estados como um concerto entre iguais, ainda que territórios, populações e PIB
possam ser totalmente discrepantes. Aos países cabe, na busca por seus
interesses, não desprezar ou agir contra os interesses alheios. Não se trata
simplesmente de querer ter um “prestígio” ou “respeito” internacional, como se
tais atributos fossem supérfluos e desnecessários ao contínuo crescimento do
país. Trata-se de, ao agir de forma agressivamente radical, alijar a nação das
grandes decisões mundiais e, como consequência, retirar da população o acesso
ao fruto de tais relações. É triste pensar na quantidade adicional de mortos,
na quantidade adicional de pobres, no número de pessoas diretamente atingidas
por bravatas emitidas e que poderiam, pura e simplesmente, terem sido não
emitidas. As relações internacionais agradeceriam. As famílias em luto ou
empobrecidas, muito mais.
Foto: vatican news
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