Como se costuma
dizer, nada é certo nesta vida, exceto a morte e os impostos. À morte ao menos
temos o benefício da dúvida de quando ocorrerá, o que nos permite fingir que
somos eternos e com isso levar a vida. Isso não vale mais para o brasileiro
Marco Archer Moreira, que neste domingo à tarde morrerá executado a tiros na
Indonésia pelo crime de tráfico de drogas, aguardando por este momento preso há
uma década. O governo brasileiro solicitou algumas vezes ao longo desse tempo
que a Indonésia o mantivesse preso mas não o executasse, sem sucesso contudo. A
última tentativa infrutífera ocorreu hoje, com nova tentativa da presidente
Dilma Rousseff em ligação com o presidente indonésio Joko Widodo.
Uma conduta
qualquer pode ou não ser crime, a depender de circunstâncias as mais variadas.
A evolução (seja no sentido de desenvolvimento, seja no mero sentido de
passagem do tempo) da sociedade pode levar uma conduta considerada crime em
determinada época deixar de ser depois (no Brasil, o adultério é um exemplo, embora
o clássico que sempre é citado seja o álcool nos Estados Unidos de Al Capone)
ou o contrário, algo que antes era aceito deixar de ser (como a escravidão). Condições
territoriais também influenciam, já que cada país determina, em seu território,
quais condutas serão ou não tipificadas, vale dizer, consideradas criminosas
(exemplos disso são a prática de jogos de azar, aborto, prostituição).
Condições religiosas e culturais igualmente influenciam a legislação de cada
Estado e todas essas circunstâncias influenciam igualmente qual penalidade será
aplicada a quem comete tais condutas (multa, prestação de serviços, restrição
de direitos, restrição de liberdade, pena de morte).
O Estado
brasileiro age corretamente ao esforçar-se em tentar evitar a execução de seu
nacional pela Indonésia. É obrigação do Estado a proteção de seus nacionais,
embora naturalmente essa proteção em território estrangeiro fique muitas vezes
reduzida a tratativas diplomáticas e políticas. A tentativa é a de evitar a
aplicação de pena de execução que o Brasil não admite. Não se trata de alegar
inocência ou mesmo tentar que seja libertado, mas apenas que não seja morto,
como não seria se o crime fosse cometido no Brasil.
Como se sabe,
a esmagadora maioria dos países no mundo não condena atualmente criminosos à
morte, sendo que a maior parte não tem mais essa pena prevista em lei e, alguns
poucos que ainda a tem, evitam aplicá-la. Quando se trata de país que a prevê e
ainda a aplica, ainda assim há subterfúgios políticos, como a solicitação de
indulto ao Chefe de Estado, para evitar sua aplicação. A pena de morte na
realidade acaba por pairar em muitos casos mais como ameaça do que como
realidade, exceto, evidentemente, àqueles condenados que, após anos ou décadas
de espera, são mortos. Há uma relação direta entre o estágio democrático de um
país e a previsão ou não de pena de morte em sua legislação, sendo os EUA e o
Japão os pontos fora dessa curva, ao lado de países como Coreia do Norte, Irã,
Somália, Paquistão e alguns outros que condenam criminosos à morte. O índice de
crimes não diminui com a pena de morte ou os países citados seriam oásis sem
criminalidade alguma. Apenas o desejo difuso de vingança é atendido.
Se condutas
tidas como criminosas e suas penas são modificadas ao sabor do momento da
sociedade, nada traz novamente à vida alguém executado, mesmo que no futuro a
conduta que o fez ser condenado não seja mais considerada crime ou a pena não
seja mais aquela outrora estabelecida, ou ainda o presidente de plantão seja
mais clemente. Resta a indignação e a tristeza, com a morte anunciada e com
mortes como a da brasileira Haíssa Vargas Motta, jovem de 22 anos igualmente morta
a tiros de fuzil, porém pela polícia no Rio de Janeiro, ceifada da vida pelo Estado
sem anúncio, sem aviso, com certeza absoluta sem o esperar.
(publicado originalmente no Estadão Noite de 16/jan/15)Nota: O brasileiro Marco Archer Moreira foi executado hoje, 17 de janeiro, às 15h31, Hor. Brasília
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