Por Carlos Roberto Husek – professor de Direito internacional
da PUC/SP e um dos coordenadores da ODIP- Oficina de Direito Internacional
Público e Privado
A diplomacia é uma atividade de várias facetas e vários
atores, nem todos com formação específica –Diplomacia– mas, provavelmente, com
o mesmo espírito: diálogo, conversa, negociação, ganhar e perder, aproximação,
superação de obstáculos, reconhecimento de espaços ocupados por outros saberes
e outras visões do mundo. Daí ser possível diplomacia sem diplomatas em
determinadas situações, mas informados pelo “fazer diplomático” (aqui a
expressão tomada não na sua estreiteza puramente técnica e sim como fundamento
das relações humanas e de Estados com estrangeiros e com outras nações):
empresários em negociação com outros empresários, governantes com outros
governantes, mas sempre com o objetivo de tornar um pouco melhor a “coisa
pública”, favorecendo o maior número de pessoas e racionalizando a governabilidade.
Quando um governante assume o poder, além das funções
administrativas, nas áreas da Economia, da Justiça, do Trabalho, do Comércio,
da Educação, da Cultura, da Indústria, da Segurança, e outras, também assume a
representação do Estado além das fronteiras. Para tanto, facilita a sua
atuação, os princípios postos na Constituição Federal, inseridos no seu artigo
4º: independência nacional (I); prevalência dos direitos humanos (II);
autodeterminação dos povos (III); não intervenção (IV); igualdade entre Estados
(V); defesa da paz (VI); solução pacífica dos conflitos (VII); repúdio ao
racismo e ao terrorismo (VIII); cooperação entre os povos para o progresso da
humanidade (IX); concessão de asilo político (X) e; integração econômica,
política, social e cultural dos povos da América Latina, visando a formação de
uma comunidade latino-americana de nações (par. único). Não é tão difícil
assim! Basta seguir a Constituição Federal, que é nossa Lei Maior. Este é o
terreno fértil onde se desenvolverá o que for plantado, com possiblidade de ser
um vistoso jardim, o patamar, a argamassa para erguer o edifício da pátria e
dizer ao mundo quem é este Estado, comandado por eventuais novos governantes.
Claro que o Estado é permanente e seus governos, provisórios, mas estes, no
tempo de mandato em que exercem as funções de governo, imprimem ao Estado a
face que ele representa para o mundo. A nossa Constituição Federal revela para
sempre a base desta face, cujas intervenções devem ser meramente cosméticas,
para realçar suas linhas, salvo atos revolucionários que a modifiquem, o que, a
seguir seus ditames, não é permitido.
Não se pense, contudo, que o governante esteja engessado pela
Constituição; não está, porque cabe a ele, no caso do Brasil, dentro dos
parâmetros constitucionais, formular a política externa que, embora não se
confunda com a Diplomacia, dela faz parte e a ela se direciona, a exemplo, como
formular ações prioritárias em relação à economia, ao Mercosul ou à África,
etc.
Guimarães Reis explicita: “Vista com perspectiva e
neutralidade, a política externa pode ser comparada a uma plataforma de
lançamento ou mesmo um palanque de comício: algo assumido e apregoado, até para
ter validade pública. Nesta matéria, o Governo que se inaugura –em geral nos
discursos de posse– não tarda em dizer a que veio, ainda que para acrescentar
simples variações do que antes fazia. Adicionalmente a política externa pode
ser objeto de um programa especial, de uma estratégia, ou mesmo de uma
´doutrina`, até o limite de um artigo de fé.”[1]
A diplomacia, ao seguir os impulsos da política externa
–repita-se, sempre atrelada aos princípios constitucionais–, como ensina o
diplomata já acima mencionado, é uma obra em aberto, em construção. O sucesso
do governante, nesta tarefa, depende de seu conhecimento, de sua sensibilidade,
de sua inteligência: “Em contraste com o que estamos caracterizando como
política externa, a diplomacia é –por natureza– uma ´opera aperta`. É uma obra
em aberto porque, em seu âmago, é um processo ´in fieri`, isto é, uma permanente
evolução, o que não obsta a consistência. Idealmente, a diplomacia prefere
deixar que o real fale por si, sem prejulgar de sua inesgotável liberdade...
(...). Acontece que o mundo não se dá em percepção instantânea– tem de ser
interpretado, inclusive em seus signos. Nesse sentido, a diplomacia é também
uma hermenêutica. Mas, é uma hermenêutica focada na situação, como já
assinalamos, porque a diplomacia lida com o momento, o particular, o atual, o
urgente. Ela ´vai às coisas`, tem de buscar incessantemente a ´verdade
efetiva`, para usar uma expressão de Maquiavel.”[2]
Desse modo, temos a Constituição Federal como base para as
ações do Governo, a política externa, como a administração do que pretende
priorizar na sua política externa e a diplomacia como meio pacífico e
inteligente de interpretar a realidade, em busca de afirmação e de progresso de
um determinado povo, construindo os relacionamentos de acordo com as
prioridades governamentais.
A tarefa é complexa. Governar é mais do que saber, é sentir.
É trabalho, é humildade, é grandeza de espírito, é vocação e a Diplomacia é a
ferramenta, interna e internacional, de que o Governo se serve para as ações
mais delicadas. Neste último aspecto deve-se servir dos instrumentos técnicos e
dos órgãos de relações externas, sob o comando do Ministério das Relações
Exteriores.
Não se pode entender Governo de sucesso sem diplomacia.
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