quinta-feira, abril 13, 2023

As projeções do nosso dia a dia

 


Por Carlos Roberto Husek – professor de Direito Internacional da PUC/SP e um dos coordenadores da ODIP – Oficina de Direito Internacional Público e Privado

 

 

Há projeções coletivas e individuais, inconscientes, que fabricam ações parecidas, não importando a região, a cultura e o tempo. Propagam-se e influenciam as pessoas dos mais variados costumes e educação, e nada tem a haver com o grau de instrução e conhecimento político ou esclarecimento sobre a vida e sobre o mundo. Multiplicam-se.

Acaso ocorram mortes em uma escola, engendrada por um desajustado, logo outras ocorrerão em outras escolas, em outros cantos, até em outros países, copiando iguais procedimentos, como se fossem repetições de um mesmo caso, com personagens diferentes.

A força da maldade parece ser mais contaminadora do que a dos bons exemplos; as demonstrações de pureza, de amor, de amizade, de solidariedade e cooperação.

Somos seres imperfeitos, é certo, mas nossa imperfeição não é só individual e, sim, coletiva. Na tela que transmite imagens do agrupamento humano, ficamos chocados e atraídos com as diversas possibilidades de infringência das regras costumeiras ou escritas e com a repercussão que isso produz e se reproduz.

O absurdo das atitudes nos emociona, porque confirma o animal, que intrinsecamente nos domina, e se não houver um ego e um superego alinhados, sofrerá, por certo, a nossa fantasiada humanidade!

Nos dias de hoje, tudo é possível: todas as crenças, todas as formas, todos os monstros que nos habitam, todas as imagens que fazemos de nós mesmos, e que justificamos, declarando ao mundo a nossa independência, o nosso orgulho, o nosso autodomínio, e, com isso, construímos um caminho pretensamente único, inseridos na repetida história dos fatos, que são jogados no ar, como tintas, e se fixam em manchas, das mais variadas cores, dando colorido à existência.

A individualidade toma conta e os fatos coletivos desastrosos, incongruentes, “foo fighters”[1], alimentam o ego, informado e em algumas ocasiões, dominado pelo subconsciente.

Que seres frágeis somos! Individualidades sem lastro, imitadores de ações coletivas, encantados pelo fantástico, não só na vida pessoal, familiar ou entre amigos, mas também na vida pública!

E isso nada tem a haver com os arquétipos de Jung[2], que funcionam como argamassas comuns, sobre a qual edificamos – sem possibilidade de escolha - a nossa estrutura psíquica. Não. O que analisamos aqui, é um fenômeno que vai do inconsciente para o consciente, ainda que este seja muito influenciado, sem percepção racional dos acontecimentos.

Daí porque existem tantos adoradores do diabo, das armas, dos homicídios, dos sacrifícios coletivos, dos suicídios, das crenças mitológicas, dos discursos de ódio, das revoluções e do sangue correndo: é o domínio das imagens, que cegam a racionalidade e a inteligência.

Não é fácil pensar. Não é fácil ler nas entrelinhas e por trás das palavras. Não é fácil ver o que não está visível a olho nu.

Olha-se para o espelho quebrado em várias partes, e o que se enxerga é um pedaço de braço acoplado a uma cintura, um olho sobre o nariz, uma das mãos sobre o ombro, uma perna em forma de arco e outra rígida, uma orelha que escapa da testa. O nosso mundo é um espelho partido, devemos desconfiar do que vemos e das conclusões que tiramos.

Os heróis são tristes figuras!

Será que podemos voar?



[1] Dizem das luzes que acompanhavam os bombardeios na segunda guerra mundial.

[2] Arquétipos são conteúdos coletivos inconscientes. Explica Jung: “uma camada mais ou menos superficial do inconsciente é indubitavelmente pessoal. Nós a denominamos inconsciente pessoal. Esyte, porém, repousa sobre uma camada mais profunda, que já não tem sua origem em experiências ou aquisições pessoais, sendo inata. Esta camada mais profunda é o que chamamos de ´inconsciente coletivo`” C.G.Jung – Obras Completas, vol. 9/1. Os arquétipos e o inconsciente coletivo, p.12, 11ª. Ed. Editora Vozes.

terça-feira, abril 04, 2023

O mundo como deveria ser

 


Por Carlos Roberto Husek – professor de Direito da PUC/SP e um dos coordenadores da ODIP – Oficina de Direito Internacional Público e Privado

 

 

Poesia e Direito, Direito e Poesia, um território único a ser explorado. Peter Haberle, considerado um dos grandes constitucionalistas europeus, incorporou as duas áreas. Em entrevista a Hector Lopes Bofill, professor de Direito Constitucional e uma das mais destacadas vozes da jovem poesia catalã, diz:

Há aspectos do direito constitucional que são especialmente sensíveis à atividade criadora dos poetas. O preâmbulo das constituições é um bom exemplo, bem como os enunciados empregados nos catálogos dos direitos. Os poetas proporcionam a suficiente dose de utopia que orienta o sentido da realidade constitucional. Poder-se-ia citar o caso da nova Constituição Federal suíça de 1999, uma parte de cujo preâmbulo foi concebida pelo poeta suíço A. Mushg ao proclamar que a força do povo se mede no bem-estar dos débeis. Os valores derivados de alguns princípios e objetivos constitucionais, como a tolerância e a educação democrática, podem fundar-se na formulação linguística e no conteúdo material enunciado pelos poetas. No que concerne aos direitos fundamentais, só haveria de referir-se à Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, cujo sucesso universal foi em parte propiciada pelo caráter contundente, sugestivo e penetrante do estilo que lhe conferiram alguns literatos reunidos na Assembleia Nacional francesa como Mirabeau.

Fico pensando que o mesmo se dá com o nosso Texto Maior, produto do momento político-jurídico de 1988, carta política e ao mesmo tempo jurídica, e de inspiração de seus próceres, sensibilizados pelo momento. O seu Preâmbulo não é obra de juristas, nem de políticos, mas de uma metamorfose que transformam uns e outros, em uma simbiose poética que deve servir de base para a interpretação de quaisquer de suas regras: “Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte Constituição da República Federativa do Brasil.

É possível dizer que aquele que na vida político-administrativa age por conta própria, discriminando, ressaltando as diferenças sexuais e raciais, tecendo longos laudatórios favoráveis às armas e aos armados, exaltando os ricos e menosprezando os pobres, protegendo as famílias de posse e pouco ou nada fazendo para minorar a vida dos pobres, estão agindo de acordo com o referido Preâmbulo?

É necessário um pouco de poesia para cumprir o mandamento constitucional. Atitude de vida, de desapego das honrarias, de amor, de mais apreço pelo povo e menos apreço pelos cargos públicos; quem possui tais caracteres? Só o ser humano público, que não defende privilégios e nem se assenta nos louros da glória, pode ler e entender o Preâmbulo da Constituição Federal, texto poético que inspira o documento fundamental da República.

Algumas palavras (figuras), postas no Preâmbulo são emblemáticas da emoção em se proclamar a Carta Magna, a saber: Estado Democrático, direitos sociais, direitos individuais, segurança, bem-estar, desenvolvimento, igualdade, justiça, sociedade fraterna, sociedade pluralista, sociedade sem preconceitos, harmonia social, solução pacífica dos conflitos.

Tem alguma conexão com armas, com neonazistas, com raça pura, com domínio sobre as mulheres, com perseguições?

Temos uma Constituição avançada, em consonância com a Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, com a Carta da ONU, em harmonia com os princípios internacionais, representativa da preocupação com o ser humano e com a humanidade, mas há ainda, no meio do povo grupos pequenos, refratários ao progresso, radicais; para os quais o raciocínio e o argumento não fazem parte do dia a dia; para os quais, o mar não é azul, o céu não é amplo, as árvores não são verdes; para os quais não há brilho no olhar: só ódio, só vingança, só ganância, só morte, só galhos secos, só águas barrentas, só nuvens plúmbeas; que só tem presente a cólera assassina e psicótica, dos que não entendem o mundo.

Eles estão espalhados nos mais diversos setores sociais, e mesmo entre aqueles que deveriam ter uma vida intelectual, supostamente superior.

Acho que nunca leram o Preâmbulo da Constituição Federal, como provavelmente, nunca leram Machado de Assis, Vinicius de Moraes, Drummond, Fernando Pessoa, Castro Alves, Guilherme de Almeida, para dizer o mínimo, sem entrar na seara dos pensadores, estes, então, passam ao largo das leituras, porque os simbolismos que alimentam a execração, a malquerença, o nojo, a repulsa, a gana, o rancor, a sanha aniquiladora do humano, fala mais alto e repercute em todos os primitivos neurônios de seus cérebros deformados. Estão cegos e surdos. Não os comove a delicadeza. Gostam das guerras, dos braços e cabeças amputados, dos fígados expostos, do sangue correndo pelo chão.

Nunca leram o Preâmbulo da Constituição Federal, ou se o fizeram, não conseguiram entender o texto, que o povo, por seus representantes, declarou como profissão de fé para o Brasil.

A bem da verdade, não é que poesia e Direito andam juntas, e sim que têm o mesmo princípio informador: a poesia, como o que é humano, sensível, racional, lúdico, alegre, vivo; e, o Direito, como o que é desejável, para manter e crescer o ser humano, em uma sociedade organizada, com base nos princípios maiores de paz, de afeto, de compreensão.

Nunca leram o Preâmbulo da Constituição Federal.

Triste miopia...

quarta-feira, março 15, 2023

Amigos da ODIP: um pouco de poesia aos operários da palavra

 


Por Carlos Roberto Husek, professor de Direito Internacional da PUC de S/P e um dos coordenadores da ODIP – Oficina de Direito Internacional Público e Privado

 

1.Um operário,

desses, de macacão sujo

e marmita,

  assim é, como me sinto

na hora solitária,

            em que trabalho

na escrita.

 

2.Vou desbastando,

                 desbastando,

 a letra e a palavra,

      a ideia vai surgindo,

 e cresce, e se constrói,

       e se destrói e lavra.

 

3.O branco puro do papel,

e da tela,

           perfurando o vazio,

a que se atrela.

            uma palavra aqui,

outra, acolá,

quem sabe, no que vai dar!

 

4.Não faço barulho,

                  e noite adentro,

vou juntando pedaços,

        histórias que invento,

advindas do meu cansaço.

      

5.Paro e olho pela janela,

olhar esticado e profundo,

deixo ferver na panela,

            meus sentimentos

do mundo.

 

6.E quando já madrugada,

    sinto as pálpebras pesadas,

guardo a caneta e o papel,

    na minha maleta de nada.

.............................................

 

É um trabalho insano,

            que produz, de tudo

e por vezes, não produz,

            não falo, fico mudo,

pregado nesta cruz.

 

Também, o ofício jurídico,

não é só consulta,

                          não é só leitura,

a criatividade faz parte

          dessa abençoada loucura!

 

Nossa matéria é o Direito,

             Interno e internacional,

o contrato que é aceito,

        o tratado, a que se dá aval.

 

E assim vamos garimpando,

entre a teoria e a interpretação,

a letra da lei diz pouco,

                  vale mais a intenção.

 

O Estado, a política, a soberania,

e as líquidas fronteiras,

 o que nos salva é a Diplomacia,

das administrativas besteiras.

 

A ciência jurídica aí está,

há para os fatos, alguma solução,

e à estátua do Direito: fala Pietá!

Cria vida na jurisdição!

 

Parodiando Bilac....

 

E os amigos dirão: ouvir o Direito,

 - Por certo perdeste o senso!

E eu vos direi, no entanto,

                        - Que abro os livros,

cheio de espanto.

- e que sentido tem, o que dizem,

quando estão contigo?

                  - amai, para bem ouvir,

porque só quem ama,

                             pode ter ouvidos,

para com eles interagir!

quinta-feira, fevereiro 23, 2023

As mazelas da comunicação e o poder – uma mera reflexão

 


Por Carlos Roberto Husek, professor de Direito internacional da PUC/SP e um dos coordenadores da ODIP – Oficina de Direito internacional Público e Privado

 

Não há efetiva separação entre Economia, Política e Informação, ou comunicação. Talvez, o mais importante para todos os campos da atividade política, venha a ser, exatamente, a comunicação; que é fundamental para qualquer governo.

Não existem governos perfeitos, mas há aqueles que não queremos, de jeito nenhum, porque desrespeitam os princípios fundamentais de convivência social, em um país institucionalmente organizado.

É engraçado, como alguns jornais agora se voltam contra as falas do presidente eleito, em relação ao que pretende fazer e em relação ao que pensa do passado. É legitima a crítica, mas, isto não pode significar que se queira o radicalismo da direita, que não respeita as instituições, a democracia e a Constituição Federal, não.

É certo que, também, não queremos o radicalismo de esquerda, não. Não queremos quaisquer radicalismos, e nisto, talvez a nossa incongruência, somos radicais. Mas, a quem interessa atacar o presidente eleito, como a dizer, que ele é um desacerto? Seria um acerto ter mantido o anterior, que sempre pregou as próprias razões como únicas –para ele não havia Congresso, não havia Justiça– e fazia vistas grossas para o desmatamento, e o incentivava (deixar passar a boiada); contrariava direitos humanos; cooptava as forças públicas; fraudava; buscava a adoração irrestrita; estimulava as “fake news”; desregulamentava a proteção indígena e todas as organizações voltadas para a defesa do ser humano; fazia pouco caso da saúde; somente tinha olhos para as armas; dizia que povo liberto é povo armado (armas sem regulamentação, bem entendido, para alguns, os amigos, embora o discurso pareça dirigir-se a todos). É isso que queremos? A quem interessa a crítica, sem parâmetros: aos golpistas?

Necessário vigiar os que foram eleitos. Isto é certo e é próprio da Democracia, fundamento e legitimidade do Estado democraticamente constituído.

Vigilância sempre, porque o poder exerce encantamento e aqueles que conquistam o poder tendem a se divorciarem rápido dos ideais, se e quando, estes, efetivamente existiram.

Vigilância sempre, para não fazerem bobagens pequenas (como, por exemplo, por uma estrela vermelha nos jardins do planalto ou pendurar uma camisa da seleção brasileira ou do time de preferência em algum mastro oficial –como se fossem propriedades particulares– ou dar cargo a mulheres de governadores e parlamentares eleitos do partido (parece que alguns já o fizeram); favorecer com cargos e comendas, amigos e parentes, como já aconteceu; não estamos devidamente vacinados contra essa prática. Não se pode errar no mínimo ético. Ou, então, grandes bobagens –bobagem é uma forma leve de referência aos desastres políticos (como mudar o rumo das instituições, para favorecer apenas o pensamento dos que estão no poder e perpetuar o domínio; armar as forças para manutenção do poder; ter posse dos bens públicos para objetivos particulares; apropriar-se dos símbolos da República; ir à guerra para afirmação das próprias razões).

E o que dizer dos recursos bilionários para a base de parlamentares (agora, acho que está em R$3 bi), para apresentarem projetos de políticas públicas que nunca saem da eventual projeção, e servem como moeda de troca para uma possível governabilidade? Tem que ser assim?

É necessário vigiar e criticar sempre. Como é difícil a democracia!

Vigiar (e orar) sempre! Há uma certa religiosidade em querer fazer o certo.

De qualquer modo, é impressionante como o esquecimento é uma das nossas mais arraigadas características sociais!

Esquecemos a ditadura e a justificamos, e entendemos que ela foi necessária.

Esquecemos a fome e a justificamos, e entendemos que ela é da natureza dos menos favorecidos pela “sorte”.

Esquecemos as mazelas do voto em papel, que favorecia nichos eleitorais e as justificamos, principalmente quando o candidato que desejamos eleito, não teve sucesso.

Esquecemos as guerras, com suas sequelas de horrores, individuais e sociais, e as justificamos.

Esquecemos as falas e as ações ditatoriais, como as tentativas de fechar o Congresso, destituir os ministros do STF, invadir o Supremo em um veículo com poucas pessoas (manda quem pode; o presidente manda não dar vacina, e o ministro da saúde, obedece); entregar medalhas da República aos familiares, mulher e filhos, pelos serviços prestados, como a Ordem do Cruzeiro do Sul ou a medalha do Barão do Rio Branco, e as justificamos.

O caudilhismo, o caciquismo, sinônimos para uma mesma doença, está no DNA dos países da América Latina: dominar, dominar o povo pela força; dominar o povo pela imagem e pelos bustos e estátuas; dominar o povo pela mitologia (os mitos), os deuses; dominar o povo pela vontade individual, sem o mínimo raciocínio coletivo; dominar o povo pela “canetada”, dominar o povo pelos emblemas, dominar o povo pelo chicote; dominar pelo berrante, como a conduzir o gado humano; dominar o povo pela força; dominar o povo pela ignorância, não prestigiando as escolas e os professores; dominar, dominar, sem atender para as necessidades sociais. E, com isso, passamos a ver beleza na vontade férrea de poucos, na obediência cega de muitos; admirados, ajoelhados e pedintes de um olhar do poder, inconscientemente elegendo para os altares particulares a personalidade midiática do momento.

É querer muito o avanço social e tecnológico para todos, independentemente de raça, religião, partido político, sexo, filosofia, opção sexual?

Só palavras e discursos resolvem?

Uns nasceram para servir e outros para mandar? É isso?

Queremos democracia plena, verdadeira, transparente: nenhum ser humano é inferior a outro; o que há, são os malandros –na ampla expressão do termo– que buscam vantagens pessoais e inferiorizam os demais. Possibilitar a aquisição de conhecimento é um perigo para os que dominam. Fazer com que o outro se creia inferior é a medida natural, às vezes na vida empresarial, e, quase sempre, na vida pública.

A quem interessa o discurso contrário aos direitos humanos, seguido de exemplos carregados na tinta, de assaltos e mortes? (Morte aos que assaltam e matam). É preciso combater o crime, mas também é necessário preveni-lo.

Por que é tão difícil entender que a escola salva e pode antever a existência do futuro bandido? Na concepção de muitos, não há jeito (pau que nasce torto morre torto –teoria lombrosiana?), mas, se isso for uma verdade, com a escola, o número de desajustados, é de se presumir, será bem menor, e para estes, em uma sociedade organizada e de progresso científico, poderá haver tratamento.

Por que criar marginalizados?

Não é lógico entender que o marginalizado de hoje é o revoltado de amanhã?

A quem interessam as armas? O ditador da Coreia do Norte fez há poucos dias uma exibição de seu armamento nuclear!

Os ditadores são previsíveis! O sofrimento é previsível! A ganância é previsível! No entanto, continuamos de olhos fechados, achando que tudo é natural!

Será que somos lombrosianos?

quinta-feira, fevereiro 02, 2023

Iemanjá - Dia 2 de fevereiro – dia de sua consagração

 


Por Carlos Roberto Husek – professor de Direito Internacional da PUC/SP e um dos coordenadores da ODIP – Oficina de Direito Internacional Público e Privado

 

 

Iemanjá, nascida do consórcio de Obatalá, o céu, com Odudua, a terra, deusa das águas, que no sincretismo católico é a Nossa Senhora, mãe do mundo, nos tenta governar, de alguma forma.

Em épocas de esgotamento e decadência, as lendas – nossa época – se lendas forem, quando bem analisadas, revelam verdades profundas.

Há um inconsciente coletivo (Jung), que aflora nos mitos, nas alegorias, nos deuses, e são tão reais e verdadeiros, que quase podem ser tangenciados, e certamente vividos. Nossa pretensa vida consciente, nada mais é do que um pálido reflexo da realidade que está intrínseca em nosso ser.

O inconsciente está levemente sedimentado pelos cascalhos acumulados ao longo da vida; que por vezes arrebentam entre essas frágeis paredes e aparecem à luz do sol, com todo o seu esplendor.

Quem somos, afinal?

Há que se duvidar das aparências e das qualificações: monstros, anjos, seres impensados, que não se denotam, mesmo que olhemos fixamente no espelho. Van Gogh tentou e até fez um autorretrato, analisando-se, perscrutando-se, sem uma das orelhas, a direita, que decepou, sem piedade, oferecendo-a embrulhada, de presente, a uma prostituta da ocasião.

Ele não era a sua orelha, ele não era nenhuma parte de seu corpo; sob os cascalhos da vida, estava internalizado, onde poderíamos encontrar o genial artista, que em uma abstinência de álcool – naquele instante – buscou cortar um pedaço de si mesmo para presentear um momento de amor.  

Iemanjá, Mãe-d´Água, também nos remete ao que está acobertado, e que de tempos em tempos, escapa e se apresenta no vai e vem das ondas.

O oceano, águas de uma grande bacia global, se agita de um para outro continente, e boa parte dos seres vivos, em momentos de dificuldade invocam os deuses, com vários nomes e várias representações, todos, provavelmente, na pele representativa de Iemanjá.

O Brasil tem sete mil, quatrocentos e noventa e um quilômetros de litoral, banhado pelo mar. Iemanjá, faz com que as ondas beijem as praias ou se encapelem raivosas, atingindo as cidades, adentrando o continente, enfurnando brancos, índios, pretos, todos, de certa forma presos, pelos grilhões líquidos e inconscientes do domínio, do egoísmo, da insensatez.

Quando os portugueses conquistaram a costa brasileira, tornaram seus trabalhadores, os índios, que lá viviam da pesca e da caça – o paraíso prometido; depois inauguraram a rota da escravidão – Brasil/África – e a partir daí, o território nacional passou a ser o encarceramento de almas, em busca de romper as cadeias civilizatórias para um novo mundo.

Iemanjá, sempre prestimosa, buscou trazer mensagens de paz – vagas suaves no mar azul – e molhar as areias, com suas lágrimas e desvelos, embora, também se exalte, e irada, em conjunto com outros deuses, principalmente Inhaçã, deusa dos ventos e da tempestade, faça multiplicar as águas, nos campos e nas cidades, como desastres infindáveis, mortes e sofrimento. Vem através dos cascalhos coletivos e individuais, e nos abraça, nos perdoa e nos castiga, por continuarmos a derrubar as matas, a matar os índios, a escravizar, a impor a todos a fome, a sede e o abandono e os planejamentos marginais.

 

Iemanjá,

               Iemanjá,

Azul, azul do mar,

suba no horizonte;

     e os continentes,

a navegar

        nas suas ondas,

sinuosas,

                sabe-se lá,

onde vão parar!

 

Que Iemanjá e os deuses tenham pena de nós!

  

 

quarta-feira, janeiro 25, 2023

 


A “Limpeza da Chaminé”

 

Por Carlos Roberto Husek, professor de Direito internacional da PUC/SP e um dos coordenadores da ODIP – Oficina de Direito Internacional Público e Privado

 

O pensamento voa e é liberto dentro de seu próprio espaço, dentro de sua própria cela. Daí justificarem-se os atos. Crer em uma revolução ou em um golpe, é crer nas próprias razões, cujo espaço não vai além da ponta do próprio nariz do crente.

A loucura está encastelada nas dobras do cérebro, como um verme que se nutre da imaginação, e contamina outros cérebros, a ponto de todos se entenderem sãos!

Em pleno Século XXI vamos à procura dessa doença civilizatória: o desequilíbrio mental ou psicose paranóide. Tantas cabeças nelas habitaram e continuam a habitar! Atingem artistas, escritores, poetas, governantes; aqueles três primeiros as transformam em seus efeitos e fazem pensar ou sentir; os últimos, os governantes, espalham o mal de tal forma e com tal força, como células cancerígenas, atingindo os centros do poder, desde os menores poderosos (o porteiro de um edifício público, o guarda da esquina), até o Presidente da República; e não há meios de cura: passa geração e vem geração, e todos estão inoculados, com a miopia do poder, alimentada pela doença mental.

Lembro de Lou Salomé[1], psicanalista que buscou remédio para os males de seu amigo Nietzche[2], com o Dr. Breur[3]: O suicídio poderia ser o único caminho, porquanto a incompreensão social penetrava nas células e átomos do filósofo, que não via solução para a incompreensão e para a injustiça.[4]

Somos todos um pouco Nietzche, e a falta de lógica do mundo nos atemoriza e nos faz padecer e pensar em suicídio social, isto é, desaparecer para o mundo, sair do palco das relações sociais, como Gretas Garbos[5], sem que nos salve a hipnose e o mesmerismo[6], talvez uma boa conversa, um bom diálogo; mas com quem trocar ideias para que se faça a “limpeza de chaminé”; tirar as ideias e os sentimentos de desespero e vitimizadores, para reverter as perspectivas, ainda mais, quando são informadas por ações coletivas?

Haveria um psicanalista de grupos e de multidões, que pudesse evitar o aparecimento de Hitler? Os hitleristas não morrem, apenas adormecem, ou desmaiam, e, possivelmente acordam quando a ocasião se fizer propícia.

Breur ou médicos equivalentes sociais (não há medicina psiquiátrica social que limpe a chaminé coletiva?), mas não teriam quaisquer possibilidades de sucesso, diante de um Goebbels[7] ou propagandista inoculado de “fake News” favoráveis às psicoses delirantes. Estamos vivendo o fenômeno da multiplicação dos “Goebbels”. Fenômeno biológico? A humanidade está necessitada de uma Lou Salomé, que busque fazer a ponte necessária entre o paciente social, o impaciente dominador e os homens e mulheres de boa vontade.

Atolados na massa informe do inconsciente, nos movemos de forma automática, informados mais pelas impressões do que pela análise e pelo raciocínio, e o que vem do fundo da alma (sem referências religiosas para esta expressão) assoma o dia a dia das nossas relações, e nos encaixamos em propósitos indecifráveis, levados por palavras de ordem, sem base na realidade visível. E, com isso, construímos a vida, na certeza de que o que vemos e sentimos é o que realmente há no horizonte.

Fica o aviso: não estamos curados. As doenças adormeceram em nós e se encapsularam. Que cada um faça a “limpeza de sua própria chaminé”



[1] Lou Adreas Salomé, psicanalista, filósofa, poetiza, ensaísta russa, seguidora de Freud e amada, dizem, de Nietzche.

[2] Friedrich Wihelm Nietzche, filósofo prussiano (Alemanha), escreveu várias obras, a exemplo de “Assim falou Zaratustra”, “Deus está Morto”, “O Anticristo”, e outras.

[3] Josef Breur, psicanalista austríaco, criador do método catártico, utilizado por Freud, a partir do qual as patologias psíquicas da histeria poderiam ser tratadas.

[4] Do livro “Quando Nietzche Chorou”, de Irvin D. Yalom, tradução de Ivo Korytowski, Editora Harper Collins, Rio de Janeiro, 2017.

[5] Greta Lovisa Gustafsson Garbo, atriz sueca, naturalizada norte-americana, que apesar de estar no auge da fama afastou-se da vida pública, levando vida reclusa.

[6] Franz Anton Mesmer, médico alemão que criou o conceito de magnetismo animal, utilizando também da hipnose para o tratamento e cura de doenças em seres humanos.

[7] Joseph Goebbels, ministro da propaganda nazista.

terça-feira, janeiro 17, 2023

Sob o domínio do ódio – Nelson Rodrigues

 


Por Carlos Roberto Husek, professor de Direito Internacional da PUC/SP e um dos coordenadores da ODIP – Oficina de Direito Internacional Público e Privado

 

O título foi tirado do livro “A poeira da glória” – uma (inesperada) história da literatura brasileira, de Martins Vasques da Cunha.

É impressionante como fatos do passado ressurgem na atualidade, com igual natureza, com a mesma têmpera, com o mesmo significado. Mudam-se os personagens, ora reencarnados em outros. Há, efetivamente, algumas diferenças de grau, não de substância: não escravizamos mais os negros, como antigamente, nem os chicoteamos ou amarramos no pelourinho para que, após vergastados, e com o sal espalhado pelas feridas, queimando ao sol, sofressem até o desmaio ou a morte – não fazemos mais isso -, pois agora são bem tratados, com certa estimação!

Não confinamos as mulheres nas cozinhas e nas poltronas fazendo tricô, acompanhadas de suas mucamas, com plena liberdade de irem do quarto à sala e desta à cozinha – não fazemos mais isso -, pois agora são bem tratadas, só as matamos quando saem foram da linha previamente traçada, para os seus próprios benefícios. No entanto, têm ampla liberdade de servir e de andar e de trabalhar, salvo se agirem por conta própria, crentes que a sociedade poder viver por e com elas! É certo que algumas pensam como homens, com seus homens, e aí se sobressaem porque seguem o melhor caminho. Há progresso!

E os nossos dirigentes, então! E nossas forças da República, então! Que progresso! Não há mais a cerimônia do beija mão –não fazemos mais isso-, no máximo vamos às redes sociais, acobertados pelos poderosos, para dizer que todos são bonitos, judiados, injustiçados, e que devem continuar mandando, e que o Judiciário é um vilão, e que o Parlamento é um vilão, e que os que pensam de forma contrária são vilões, mas devem, pacientemente ser conduzidos às melhores práticas. É necessário destruir as obras de arte, queimar as constituições, quebrar vidraças, arrebentar cadeiras, deixar excrementos sobre a mesa de juízes, tudo com o ódio santificado, dos justos, porque “deles será o reino dos céus”.

Martins Vasques analisa Nelson Rodrigues e sua época –qual era mesmo o ano, 1964, 1968, 2021, 2022?– fico na dúvida; essa questão, sobre épocas, é complicada: os fatos parecem às vezes, tão iguais – embora nomes diferentes – que dá impressão que entramos em um túnel do tempo, em um buraco de minhoca e voltamos ao passado!

Diz o escritor: “O que Nelson Rodrigues percebeu como poucos é que o abismo que invadia a sociedade brasileira era o ódio fundador de um novo Brasil, um Brasil que era o oposto de tudo aquilo que tinha até então vivido, um Brasil que não tinha outra forma de ser chamado senão ´O Anti-Brasil`.

Um dos sinais mais evidentes de que estava surgindo um novo Brasil foi a leitura do regulamento do concurso literário que afirmava explicitamente que os contos por selecionar poderiam ser sobre todos os assuntos, menos o amor. Como assim? Para Nelson, só o amor (e o desejo de sua contrapartida, seu complemento) merecia ser matéria de criação. Apesar do romancista Lúcio Cardoso (autor de Crônica da casa assassinada, um romance do mesmo calibre de um Willian Faulkner) ter sido uma voz solitária contra esse regulamento estapafúrdio. Nelson sentia que ali havia o sintoma de algo que não era ´intranscendente´ (como costumava escrever em suas crônicas) – o início do ódio ao amor.

Este era o fundamento do ´Anti-Brasil`, o país que aceitava tranquilamente, entre os seus elevados representantes da elite intelectual, que o pacto germânico-soviético Molotov-Ribbentrop (a aliança entre Adolfo Hitler e Josef Stalin, que duraria a invasão da parte soviética na Polônia feita pelo primeiro em 1941) fosse visto como algo absolutamente normal. Apesar de ter acontecido há quase trinta anos, quando o ´Anti-Brasil` começava a mostrar suas garras –era 1968 e Nelson já estava com seus 55 anos– o pacto ainda atiçava a imaginação do dramaturgo carioca porque foi ali que notou que ´o ódio começava a ser mais promovido do que marca de refrigerante`. É a primeira coisa que o ódio faz entre as pessoas, pensou, é igualá-las entre si, torna-las gêmeas nunca no seu melhor, mas no seu pior –assim como aconteceu com ele ao ver a famosa foto de Stálin cumprimentando o coronel alemão Ribbentrop com uma alegria contida. Se era possível o pacto germano-soviético, concluiu, se o mundo o aceitou, então tudo é permitido e, portanto, o seu amigo Otto tinha razão: o mineiro só é solidário no câncer...(...). Tudo era muito lógico. Neste país, Hitler e Stálin tinham vencido porque eram ´constituídos de ódio` -e o povo brasileiro se via na insólita situação de optar por um ou por outro. Todos eram pequenos Stálins ou pequenos Hitlers –e quem não aceitasse esse ´processo de desumanização` que se virasse ou então muda-se de país...(...). Como resistir, a essa avalanche do ódio que parece dominar-nos com uma força impressionante?”[1]

No Brasil de hoje, há uma ascensão extraordinária da extrema direita radical, pequenos e grandes Hitlers, estão empunhando armas, alimentados de ódio, e achariam normal o pacto germânico-soviético, porque nada é tão similar e parecido do que o domínio do mais forte, o domínio das armas, o domínio do terror: esquerda ou direita? É só uma mera classificação para justificar a irracionalidade do ódio.

Há salvação?

Como já escrevi alhures, se Cristo voltasse à Terra, no Brasil de hoje, seria crucificado!

“Vade retrum, Satanás!”



[1] Da Cubha, Martin Vasques. A poeira da glória – uma ( inesperada) história da literatura brasileira – Editora Record, 2015, 1ª edição.

segunda-feira, janeiro 09, 2023

Endemoniados

 


Por Carlos Roberto Husek, professor de Direito Internacional da PUC/SP e um dos coordenadores da ODIP – Oficina de Direito internacional Público e Privado

 

 

É estarrecedor!

Quem pagou os radicais para irem de todos os cantos da República para Brasília, com a única finalidade de invadir o Congresso, o Executivo e o Judiciário, quebrando, depredando, roubando; raivosos como bando de trogloditas furiosos, comandados por vozes interiores, tomados por pelos espíritos das trevas, dançando sobre os símbolos da Democracia, enrolados em bandeiras, como se fossem donos do Brasil?

Quem financiou tudo isto? Porque, aquele que trabalha e estuda e necessita pagar impostos e progredir e tem sua família e necessita alimentar seus filhos, provavelmente não dispõe de tempo para se dirigir à capital do Estado e promover atos de vandalismo.

E os órgãos de segurança pública? E o governo do Distrito Federal? E as forças militares? E a Constituição Federal? Atacar o Supremo Tribunal Federal, abaixar as calças e fazer xixi em cima de uma mesa, roubar togas, arrebentar cadeiras e vidros, é exercício de liberdade individual, coletiva e democrática?

É estarrecedor!

O Brasil merece isto? O pavilhão nacional pode acobertar atos de vandalismo?

É estarrecedor!

Continuamos copiando dos Estados Unidos o que é de mais torpe e ruim (invasão do Capitólio: (des) Governo Trump)?

É estarrecedor!

Em que nossos eventuais líderes se diferenciam de outros que saqueiam, matam, encarceram, quebram, vociferam, só para manterem-se no poder?

É estarrecedor!

Éramos o país do futebol, das praias, do samba triste e romântico, do espírito afável e acolhedor, dos poetas, do futuro, do alto índice civilizatório: tudo mentira?

Tudo mentira. Em nosso inconsciente há uma camada grossa de neurose e psicopatia. Somos um país triste e possuído.

É estarrecedor!

As caretas dos manifestantes são próprias dos filmes de “poltergeist”, dos fenômenos sobrenaturais, caracterizados por manifestações de espíritos diabólicos, em que os seres humanos viram objeto, “cavalos”, incorporando seres estranhos, com o senho contraído, os lábios deformados, os olhos vermelhos!

Olham-se em algum espelho e enxergam a deformidade de que estão endemoniados? O que somos, agora? Isso!

É estarrecedor!

 

(com a licença de Castro Alves, em Navio Negreiro)

 

Existe um povo que a bandeira empresta

Pra cobrir tanta infâmia e cobardia!...

E deixa-a transformar-se nessa festa

Em manto impuro de bacante fria!...

Meu Deus! Meu Deus! Mas que bandeira é esta,

Que impudente na gávea tripudia?

Silêncio Musa... chora, e chora tanto

Que o pavilhão se lave no teu pranto!...

 

Auriverde pendão da minha terra,

Que a brisa do Brasil beija e balança,

Estandarte que a luz do sol encerra

E as promessas divinas da esperança...

Tu que, da liberdade após a guerra,

Foste hasteado dos heróis na lança

Antes te houvessem roto na batalha,

Que servires a um povo de mortalha!...

 

Fatalidade atroz que a mente esmaga!

Extingue nesta hora o brigue imundo

O trilho que Colombo abriu nas vagas,

Como um íris no pélago profundo!

Mas é infâmia de mais!...Da etérea plaga

Levantai-vos, heróis do Novo Mundo!

Andrada! Arranca esse pendão dos ares!

Colombo! Fecha a porta dos teus mares!

 

 

 

 Crédito imagem: O Estado de São Paulo

quarta-feira, dezembro 21, 2022

Um momento natalino (um poema-crônica)



Por Carlos Roberto Husek, professor de Direito Internacional da PUC/SP, e um dos coordenadores da ODIP – Oficina de Direito internacional Público e Privado

 

Introito:

 

Um momento natalino,

                rememorado,

sibilino.

Se Cristo estivesse vivo

ao escrever agora, supus,

             seria crucificado

e morreria na cruz.

 

 

Um rei que não tinha trono,

um rei que não tinha cama,

um rei que não tinha ouro,

um rei que não tinha prata.

 

Envolvido em panos,

        branca espiritualidade,

porém tropas de insanos,

        a cavalos pela cidade,

ordens de Nabucodonosor,

-“Matai todas as crianças”-

será apenas uma rápida dor,

em jogo, o futuro das finanças,

este é o aviso do grande ditador.

 

Mas aí veio o imprevisível,

       nasceu quem não podia,

pelas mãos do invisível,

       numa pobre estrebaria.

 

Um rei que não tinha trono,

um rei que não tinha cama,

um rei que não tinha ouro,

um rei que não tinha prata.

 

E somente com seu sorriso,

     trouxe um natural tesouro,

de perdão e compreensão,

      afastando o mau agouro,

em eclosão.

As mãozinhas delicadas,

          desenhadas de emoção

muitos milagres, muita luz,

palavras, bençãos em profusão,

mas os anos foram passando,

           e em processo viciado,

de mentiras alimentado,

a sentença veio de inopino,

esqueceram-se do menino,

          e o condenaram à cruz.

 

Os soldados de Pilatos,

                      armas do poder,

impingiram-lhe maus-tratos,

   porque se atrevera nascer,

registrando-se como Jesus.

 

E hoje assim vivemos,

o bem e o mal, luta aguerrida,

é o que, por agora temos,

            em nossa curta vida,

mas, ficou para eternidade,

          uma importante lição,

deixemos de lado,

            o poder e a vaidade,

para sermos só coração.

 

                    Feliz Natal para todos da ODIP