segunda-feira, maio 03, 2021

Peça do Absurdo


Carlos Roberto Husek – Prof. de Direito Internacional da PUC/SP


Luzes e sombras e no grande teatro da História desenvolve-se a peça do absurdo!

“Minha filha, você perdeu a cabeça?”

 Abrem-se as cortinas e no palco, surge apenas um corpo sem cabeça. E todos riem; alguns choram...

Questões incompreensíveis e uma afirmativa:

1.    Os auxiliares tentam convencer o chefe de tomar vacina?

2.    Há auxiliar que necessita tomar vacina escondido do chefe, por que senão ele fica contrariado?

3.    Fazer a CPI e votar livremente naquele que será o relator e o presidente de uma comissão no Congresso, por um congressista, é trair o chefe?

4.    Para instaurar a CPI há necessidade, por extensão, instaurar uma CPI dos Governadores, para abrir todas as possibilidades de defesa. Melhor forma de defesa é o ataque?

Afirmativa:

É fato notório, comprovado, claro, inequívoco que apesar de alguns Governadores não agirem como deveriam, se não fosse a ação deles com medidas de isolamento, o Brasil estaria muito pior.

A par disso tudo, que, infelizmente, não tem mais jeito, porque o que interessa para o governo é o binômio, “eu mando e você obedece”, talvez de forma dramática e catastrófica, haveria a derrocada de um país que sonhou em ser grande?

 Não pelas armas, mas pela exuberante natureza, por sua diplomacia, pelo seu alto índice civilizatório, por não compactuar com milícias, com terrorismos, com racismo. Tudo, um pouco românico, é claro, mas havia na alma do brasileiro estes sentimentos, estas ideias, que agora morreram, oferecendo a verdadeira face, a face do terror, a face do medo, a face a desinteligência. Este, talvez, seja o verdadeiro Brasil. Só pode ser! Um país, em que os auxiliares (não foi só um, foi mais de um), tentam convencer o chefe de tomar a vacina, como se tentassem dar a uma criança um remédio dentro de uma guloseima, para criança pensar que não tomou; um país, que um auxiliar necessita esconder do chefe que tomou a vacina, para não entrar no rol dos desobedientes; um país, que os que votam contra a vontade do gerente maior, são tidos como traidores e aqueles que escrevem, dão aulas, fazem palestras, divulgando outras ideias, que não as advindas do poder, são perseguidos e ameaços pelas milícias ideológicas;, digitais e até físicas; um país, em que o supremo mandatário da nação se põe em oposição aos governadores ( não governa junto! ), só porque sente que foi contrariado no seu pensamento; um país, que os auxiliares – não importa a pasta – acusam a China de produzir o vírus-comunistas e depois, para não ficar ruim se desdizem; um país, em que a pasta mais importante é o da obediência irrestrita (pensar nunca!); um país, que rebaixou o Ministério do Trabalho (que é outro lado de uma mesma moeda de governo; uma face, a economia, a outra, o trabalho, uma não vive sem a outra - “Rerum Novarum”, Leão XIII), para uma simples secretaria, e aos poucos vai tirando todos os direitos dos trabalhadores; um país, que ainda vê a fraqueza da economia, nos salários e não na corrupção; um país, que reúne todos os auxiliares de governo numa mesma bacia (bacia das almas) e não dá oportunidade de administração coerente em cada área; um país, que em tempos de crise econômica, de saúde, de justiça, de educação, provoca mais crises políticas e põe um personagem contra o outro no palco do Estado (dividir para governar), como um grande “big brother”, em que os diálogos ficam foram do contexto e o público ávido fica apostando nos vencedores; um país, em que a Educação ficou em segundo, terceiro ou quinto plano, ou plano nenhum, porque todos  que passaram pela Educação foram céleres, deseducados, contrários à informação, desrespeitadores das instituições, outros talvez se perpetuem sem esses desfeitos, mas a desconfiança fica no ar e se concretiza a cada dia; um país, em que proclama-se em alto e bom som que o certo seria fechar o Congresso e o Supremo Tribunal Federal; um país, em que se decide qualquer problema pela briga, ou no pronunciamento à mídia, por quem deveria primar pela serenidade,  “pela porrada”

Este é o enredo da peça do absurdo: em que as pessoas valem pelo corpo, pelo sexo, pelo armamento, pela negatividade, pela dissimulação, pelo escárnio, pelo desafio (peito inflado dos halterofilistas), pela devastação da linguagem e do trato. Perdeu-se o verniz, a pátina da civilização, o progresso do “pithecanthropus erectus”, e voltamos a arrastar a companheira pelos cabelos e a jogar os inimigos no caldeirão fervente, para servirem de exemplo.

E a Educação é tudo! Não é? Ou não é?

Os gregos que o digam, mas também os ingleses, os alemães, os japoneses, os franceses, os norte-americanos, que formaram, bem ou mal, grandes nações. O que nós formamos até agora? Somos grandes em nosso território. E isso é pouco, muito pouco.

Acho que perdemos o rumo.

“Todo povo que atinge um certo grau de desenvolvimento sente-se naturalmente inclinado à prática da educação (...) Uma educação consciente pode até mudar a natureza física do Homem e suas qualidades, elevando-lhe a capacidade a um nível superior (...) Na educação, como o Homem a pratica, atua a mesma força vital, criadora e plástica, que espontaneamente impele todas as espécies vivas à conservação e propagação do seu tipo (...) Antes de tudo, a educação não é uma propriedade individual, mas pertence por essência à comunidade (...) Da dissolução e destruição de normas advém a debilidade, a falta de segurança e até a impossibilidade absoluta de qualquer ação educativa.[1]

O poder do dirigente não está nas armas, nas milícias, no domínio, no medo, está na sua inteligência em dirimir conflitos, aproximar pessoas e credos, liderar pelo exemplo, dialogar, abrir as discussões, ouvir os que se opõem, que é uma forma de saber a verdade, cercar-se de ministros especializados em suas respectivas áreas e ouvi-los – saber ouvir é o caminho do conhecimento e poder ser contrariado é o caminho do aprendizado. Aprendemos muito mais com os que nos contrariam, do que com aqueles que nos bajulam. Os amigos, dignos desse nome, dizem o que está errado; os aproveitadores dizem o que se espera ouvir. Judas beijou Cristo e não era o mais amoroso e fiel dos apóstolos.

Quando vamos aprender?

A cada dia uma pá de cal é jogada nas covas da sociedade brasileira. Acaso assim continue o ofício tétrico, nem carpideiras sobram para chorar nas salas sepulcrais das vigílias, noite adentro, com ou sem a presença de corpos.

 

... Depois do aparecimento do corpo sem cabeça, as cortinas se fecham e alguns saem segurando o próprio pescoço, para ver e sentir que tudo, apesar dos pesares, continua no devido lugar.

Afinal, as instituições ainda funcionam. Alívio!

 



[1][1][1] Jaeger, WERNER. PAIDÉIA  - A formação do homem grego -Martins Fontes, 1995


 

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