Por Henrique A. Torreira de
Mattos
A Teoria da Trasnormatividade parte da premissa de que no mundo em que
vivemos, onde existe uma interação sobremaneira do ponto de vista das relações
econômicas, sociais e culturais, proporciona uma discussão entre governos, seja
no âmbito local, nacional, regional ou global, de modo que as normas
internacionais deixam de ser discutidas internacionalmente pura e simplesmente,
sendo discutidas em diversos foros independentemente de fronteiras.[1]
Na década
de 1950, Philip Jessup[2]
abordava o tema com muita propriedade. Para ele as relações transnacionais
entre os seres humanos produziam consequências transnacionais, não cabendo a
justificativa da aplicação do Direito através das doutrinas monista e dualista.
No seu entender, em situações como esta a transnormatividade ocorre entre a
relação existente dos dois Direitos Internos, direcionados pelo Direito
Internacional.
Neste
âmbito, o Direito Internacional origina-se da relação entre dois Direitos
Internos e não os cria, definição que na época era contrária ao pensamento
corrente que de certa forma via no Direito Internacional uma via direcionadora
do Direito Interno (escolas monista e dualista).
Neste
ponto, sua teoria era contrária ao monismo e ao dualismo por dois fatores. O
primeiro, se baseava na relação entre seres humanos, que de certa forma
configurava o mesmo princípio formador do Direito Interno. O outro fator, em
função de analisar a questão da perspectiva interna para a internacional.
Para Philippe
Braillard[3],
em estudo realizado sobre a sociedade transnacional, este a definiu como um sistema de interação, num
domínio particular, entre atores sociais pertencentes a sistemas nacionais
diferentes, visualizando que no interior de cada sistema nacional, as
interações são decididas por elites não-governamentais e continuadas
diretamente pelas forças sociais, econômicas e políticas nas sociedades de que
fazem parte.
Diante
desta explicação pode ser inferido que entre o Direito Internacional e o
Direito Interno existe uma relação baseada em três pilares (internacional,
global e interno) que caracterizam uma relação transnormativa.
O primeiro
pilar acima citado, o internacional, representa uma tendência Estatal normativa
internacional que visa a criação de determinada norma. O segundo, ou seja, o
pilar global, representa o foro de discussão da sociedade civil internacional
com exceção dos Estados, e por fim, o pilar local, representa a sociedade civil
interna que promove a manutenção da conduta discutida nos foros internacionais.
Atualmente,
a Teoria da Transnormatividade vem criando situações onde a transposição de um
direito por outro, proporciona efeitos mais ágeis para amparar a globalização.
Em muitas situações a cópia do direito alienígena, visando uma adequação
interna para se preparar ao mundo global é importante e com certeza fomentou, e
ainda fomenta, uma maior interação entre os Estados.
Um ponto
importante a ser analisado é se, esta rápida adaptação transnormativa, seria
sustentável, tendo em vista a distinção cultural, social e legislativa além
fronteiras. Em outras palavras, antes da aplicação de uma norma transnacional
deve haver um debate interno grande, a ponto de definir se a aplicabilidade
desta norma alienígena é viável ou não, e é compatível ou não aos parâmetros internos.
Para Wagner
Menezes:
“Essa
relação transnormativa se caracteriza por vários fatores de alocação de uma
nova realidade internacional que, através de seus instrumentos normativos
produzidos no plano internacional, dissolvem as fronteiras e possibilitam uma
interpenetração de normas jurídicas entre o local e o global em um mesmo espaço
de soberania e competência normativa. Elementos de fundamentação da construção
normativa, como as fontes do direito, incluindo as soft law; o direito
comunitário e seus mecanismos específicos para regulamentação intra-bloco; as
regras de direitos humanos que passam de uma simples resolução e adotam cada
vez o caráter de um ius cogens, um direito imperativo que deve ser
respeitado e observado por todos os povos; as organizações internacionais, seus
foros e sua atividade pseudo-Iegislativa; a transnacionalização da ordem
econômica que envolve um número maior de temas e opera entre fronteiras, não só
através do seu principal objeto, que é o capital, mas também por sujeitos
operacionais, como as empresas transnacionais.”[4]
Diante das
considerações acima, o que se nota é que a Teoria da Transnormatividade recebe
críticas, pois pode colocar em risco o conceito clássico de soberania, uma vez
que o Estado não possui mais, necessariamente, o poder criador da norma
internacional do ponto de vista analisado pelas doutrinas monista e dualista.
Ao contrário, o Estado passa a ser receptor de normas estrangeiras, que muitas
vezes podem ter sido criadas por um outro Estado, organizações internacionais
ou pela própria sociedade civil internacional.
Outro ponto
a ser considerado, é o fato de que tais normas não necessariamente
subordinam-se a hierarquias internas do Estado para produzirem seus efeitos, ou
seja, não se trata de um ius cogens.
Nota-se,
portanto, que além das barreiras geográficas, as normas ultrapassam também
barreiras jurídicas, filosóficas e sociológicas, sendo criado um espaço global
normativo.[5]
Bibliografia:
HELD, David; MCGREW, Anthony. “Prós e contras da
globalização”. Tradução Vera Ribeiro. Editora Zahar, 2001;
JESSUP, Philip C. “Direito transnacional”. Tradução
Carlos Ramires Pinheiro da Silva. Editora Fundo de Cultura, 1956;
BRAILLARD, Philíppe. “Teoria das relações
intemacionais”. Tradução J. J. Pereira Gomes e A. Silva Dias. Fundação Calouste
Gulbenkian, 1990;
MENEZES, Wagner. “Ordem Global e
Transnormatividade”. Editora Unijui. 2005;
IANNI, Octávio. “A era do globalismo”. Editora
Civilização Brasileira, 1996.
[1] HELD, David;
MCGREW, Anthony. “Prós e contras da globalização”. Tradução
Vera Ribeiro. Editora Zahar, 2001. Pág. 88.
[2] JESSUP, Philip C.
“Direito transnacional”. Tradução
Carlos Ramires Pinheiro da Silva. Editora Fundo de Cultura, 1956. Pág. 124.
[3] BRAILLARD,
Philíppe. “Teoria das relações intemacionais”.
Tradução J. J. Pereira Gomes e A. Silva Dias. Fundação Calouste
Gulbenkian, 1990. p. 275.
[4] MENEZES, Wagner.
“Ordem Global e Transnormatividade”. Editora Unijui. 2005. Pág. 204.
[5] IANNI, Octávio. “A
era do globalismo”. Editora
Civilização Brasileira, 1996. Pág.178.
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